terça-feira, 28 de dezembro de 2010

ENTRE A JUSTIÇA E A GRAÇA

por Marcos Monteiro

A Igreja Batista da Graça na cidade de Salvador, BA, sofreu uma ação de interdição judicial e o pastor ficou temporariamente afastado de suas atividades eclesiásticas. O episódio foi divulgado pelos jornais, apenas porque o Pastor Edvar Gimenes de Oliveira, amigo pessoal, resolveu enfrentar a esquisitice do fato com uma greve de fome. O fato é esquisito por diversos motivos.


Primeiro, a ação judicial é resultado da ação de uma minoria tão minúscula, diante da maioria absoluta que apóia o pastor que o fato se constitui como uma violência interna. Todo o cidadão tem direito de recorrer à justiça, quando se sente lesado em seus direitos, mas há sentimentos e sentimentos. Nesse caso, o bom senso pode ajudar pessoas a não transformarem em legais questões pessoais, em que motivações tais como desejo de poder, vaidade pessoal, ou frustrações quaisquer, embotem a capacidade de julgamento até sobre nós mesmos. A ação partiu de um desembargador, cargo que sabemos, no sistema judiciário, administra uma dose considerável de poder e influência, o que se constitui como um desafio diante de princípios éticos e valores morais.


A relação entre sociedade civil e sociedade política sempre foi complexa, mas nós vivemos um momento singular na história, especialmente diante do fenômeno religioso. A religião é um campo de significações propenso aos exageros e desmandos éticos. No modo de ser de uma igreja batista, entretanto, há mecanismos de decisão e de controle que diminuem a possibilidade de tais excessos. Assembléias, relatórios minuciosos, transparência administrativa e financeira, distribuição de cargos e responsabilidades, transformam as igrejas batistas em associações com um pouco mais de dificuldade de acontecerem desvios. Conhecendo Edvar de muito tempo, sei que ele se sente bem à vontade nesse tipo de associação, tendo o cuidado democrático e a transparência administrativa como marcas de todas as suas gestões, quer em igrejas quer em outras instituições similares.


A greve de fome que o pastor iniciou e que já encerrou diante de fatos novos mais promissores, tem um interessante viés. Pretendeu ser um ato político para chamar a atenção sobre a possibilidade de uma ingerência indevida do estado sobre a igreja. As relações entre estado e igreja são históricas e faz parte da configuração do estado laico considerá-las instâncias separadas. Essa autonomia, obviamente, é relativa apenas diante da lei que gere todas as instituições vigentes no país. Em todos os outros casos, igreja e estado, seguem suas próprias lógicas e caminhos. Essa intervenção, portanto, pode se configurar como uma violência do poder político contra o poder religioso.


A fome é uma estratégia da vida para garantir a sua continuidade. Somos todos animais famintos. Quando usada como instrumento de luta, uma nova qualidade é acrescida à essa fome, lembrando-nos da fome de justiça mencionada no Sermão da Montanha, como palavra de Jesus. Greve de fome é recurso de quem chegou a limites, recurso dos sem recursos, poder dos desempoderados, diante de uma concentração de poder desproposital. Ausência, carência, vazio, transformados em armas de guerra, pequenas pedras na funda de Davi, diante das armas técnicas dos Golias.


Nesses momentos, o estado parece voltar a ser o Leviatã, esse animal artificial terrível que, segundo Hobbes, criamos para nos livrar de nós mesmos. Uma todo-poderosa fera criada para submeter o lobo que nós somos. A história da modernidade pode ser lida como a tentativa de todos para domesticar essa fera. O estado laico e a separação dos poderes, essa trindade profana, executivo, legislativo e judiciário, seriam duas coleiras construídas para facilitar o controle da fera. O episódio em pauta, portanto, coloca todas as nossas conquistas sob judice.


No cenário montado, a relação entre duas palavras, “justiça”, palavra profana, e “graça”, palavra teológica. A justiça é essa impossibilidade matemática: a precisão, o ponto exato, a justeza. A graça é ela mesma uma palavra graciosa, que nos leva a engraçar com pessoas e a achar graça na vida, mesmo em situações esdrúxulas. É um ultrapassar, um acrescentar algo mais a todas as situações, como uma espécie de sopro divino condescendente. Quando a justiça tenta embargar a graça, acontece um desequilíbrio. Os fariseus, que Jesus criticava, eram bons de justiça e ruins de graça. Portanto, a graça tem sempre de prevalecer diante da justiça, senão a própria vida corre o perigo de perder a graça.


Feira de Santana, 24 de dezembro de 2010.

*Marcos Monteiro é assessor de pesquisa do CEPESC. Mestre em Filosofia, faz parte do colégio pastoral da Comunidade de Jesus em Feira de Santana, BA. Também é coordenador do Portal da Vida e faz parte das diretorias do Centro de Ética Social Martin Luther King Jr. e da Fraternidade Teológica Latino-Americana do Brasil
CEPESC – Centro de Pesquisa, Estudos e Serviço Cristão. E-mail cepesc@bol.com.br, site www.cepesc.com.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Navegando sem perder o foco, mesmo em meio a tempestades!

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Algo dentro de mim que ninguém pode tirar

"Eu lhes digo, meus amigos: Não tenham medo dos que matam o corpo e depois nada mais podem fazer. Mas eu lhes mostrarei a quem vocês devem temer: temam aquele que, depois de matar o corpo, tem poder para lançar no inferno. Sim, eu lhes digo, esse vocês devem temer.” (Lc. 12.4-5)

“Pois Deus não nos deu espírito de covardia, mas de poder, de amor e de equilíbrio.”
(II Tim. 1.7)

Há algo dentro de mim que ninguém pode tirar
Há algo dentro de mim que ninguém pode matar
Há algo dentro de mim que ninguém pode anular
Há algo dentro de mim que ninguém pode apagar
Há algo dentro de mim que ninguém pode atingir

Há algo dentro de mim que ninguém é capaz de fazer:
É destruir minha capacidade de recomeçar, de renascer.

Alguém pode ser capaz de me difamar
Alguém pode ser capaz de me magoar
Alguém pode ser capaz de me humilhar
Alguém pode ser capaz de me desempregar
Alguém pode ser capaz de me fazer adoecer
Alguém pode ser capaz de me desestruturar
Alguém pode ser capaz dos meus amigos me separar
Alguém pode ser capaz de me marginalizar
Alguém pode ser capaz de me "processar"!

Mas há algo dentro de mim que ninguém é capaz de fazer:
É destruir minha capacidade de recomeçar, de renascer.

Alguém pode pensar ter me destruído, destruindo meu corpo
Alguém pode pensar ter me destruído, calando minha voz
Alguém pode pensar ter me destruído, menosprezando meus sonhos
Alguém pode pensar ter me destruído, destruindo minha reputação
Alguém pode pensar ter me destruído, destruindo a história que escrevi

Mas há algo dentro de mim que ninguém é capaz de fazer:
É destruir minha capacidade de recomeçar, de renascer.
Isso é graça divina e ninguém pode controlar
Copyright Edvar Gimenes de Oliveira
 xxx
Morning Has Broken  



Morning Has Broken Cat Stevens
Morning has broken, like the first morning
Blackbird has spoken, like the first bird
Praise for the singing, praise for the morning
Praise for the springing fresh from the world

Sweet the rain's new fall, sunlit from heaven
Like the first dewfall, on the first grass
Praise for the sweetness of the wet garden
Sprung in completeness where his feet pass

Mine is the sunlight, mine is the morning
Born of the one light, eden saw play
Praise with elation, praise every morning
God's recreation of the new day

A manhã se rompeu
Como a primeira manhã
O melro cantou
Como o primeiro pássaro
Louvor para o canto
Louvor para a manhã
Louvor para o nascimento recente
Do mundo

Doce é a chuva do novo outono
Iluminada pelo sol vindo do céu
Como o primeiro orvalho
Sob a primeira grama
Louvor para a doçura do jardim molhado
Brotado em completude
Por onde os pés dele passam

Minha é a luz do sol, minha é a manhã
Nascida de uma luz, o paraíso viu a diversão
Louve com entusiasmo, louve cada manhã
A recriação de Deus do novo dia

A manhã se rompeu
Como a primeira manhã
O melro cantou
Como o primeiro pássaro
Louvor para o canto
Louvor para a manhã
Louvor para o nascimento recente
Do mundo


quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Confissão de fé


 "Com Cristo no barco tudo vai muito bem...e passa o temporal"
Aprendi isso na infância, por isso me molho no temporal, mas não fujo dele!


Mesmo não florescendo a figueira, 
e não havendo uvas nas videiras, 
mesmo falhando a safra de azeitonas, 
não havendo produção de alimento nas lavouras, 
nem ovelhas no curral nem bois nos estábulos, 
ainda assim eu exultarei no Senhor 
e me alegrarei no Deus da minha salvação.
O Senhor, o Soberano, é a minha força; 
ele faz os meus pés como os do cervo; 
faz-me andar em lugares altos.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Dialogando com o porteiro da Igreja Batista da Graça

Paro no portão de saída do estacionamento da IBG.

Enquanto o portão se abre eletrônica e lentamente, o porteiro se levanta, aproxima-se da porta do meu carro e diz:

- Pastor, eu tava aqui pensando em Dilma Rousseff.
- Em que? pergunto eu.
- Ela ainda não indicou nenhum ministro baiano - respondeu ele.
- Enquanto isso tem um monte de São Paulo - retruco de cá afinando ao discurso dele - e olha que sou paulista...
- Pois é, eu e toda a minha família votamos nela e a Bahia foi um dos Estados que ela teve a maior votação.
- Pois é...

O portão se abriu, o trânsito da rua clareou, acelerei pensando no PT, PMDB, PSB, PR, enfim e agora nos Pês da IBG - porteiro e pastor - todos interessados, por razões diferentes, na composição ministerial.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Mensagem à Assembleia de Fundação da Aliança Evangélica

 por Bispo Robinson Cavalcanti (*)

 
– Não Se Faz História Sem História –
 
Amados irmãos e irmãs presentes a esse histórico momento:

O renomado pensador anglicano C. S. Lewis, em seus escritos, sempre chamou a atenção para os riscos daquelas gerações que se acham “refundadoras” do mundo, ignorando e desprezando tudo o que a civilização construiu antes dela. Alguns dizem que as mesmas “querem descobrir a roda, ou a pólvora outra vez”. Desde a Reforma Radical que uma expressão do anabatismo como ideologia tem se manifestado nessa visão de uma “apostasia” da Igreja antes da sua geração, com o Espírito Santo “tirando férias” entre a morte do apóstolo João e o nascimento de Lutero, ou o surgimento de algum grupo ou movimento posterior. O “restauracionismo” sempre tem rondado – e tentado – o Cristianismo. Hoje, mais na Igreja do que no próprio século, vive-se a síndrome de uma “geração sem umbigo”, individualista, imediatista, iconoclasta, antinômica e presentista.

Já se afirmou que um povo sem passado é um povo sem futuro e que um povo sem história é um povo sem identidade. Essa manhã, gostaria de reafirmar o caráter uno, santo, católico e apostólico da Igreja de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Gostaria de reverenciar a memória dos santos e mártires de todas as épocas e lugares. Gostaria de reafirmar a “comunhão dos santos”, e, ao mesmo tempo, denunciar como pecado e tragédia esse anti-historicismo, anti-institucional, irracional, irresponsá-vel, de previsíveis trágicas consequências. A honestidade intelectual forçará a nossa consciência reconhecer que “nunca antes na Igreja Evangélica desse País” o seu povo foi tão ignorante e tão preconceituoso em relação à sua história e ao legado dos seus antepassados. Esse é um dos aspectos centrais da crise do protestantismo brasileiro, e não haverá saída sem uma mudança, em que possamos construir o presente, com alvos para o futuro, a partir do passado.

Sabemos que a Guerra dos Trinta Anos, entre Estados Protestantes e Estados Católicos, conduziu a um cansaço cultural que gerou, por um lado, a reação iluminista, o agnosticismo e o materialismo, e, por outro lado, um “congelamento” nos embates apologéticos e nos esforços missionários mútuos, com uma territorialidade confessional oficial ou oficiosamente estabelecida, e um olhar evangelístico voltado apenas para os povos ditos “pagãos”, fossem eles primitivos ou seguidores de antigas religiões não-monoteístas ou não-trinitárias. Daí o protestantismo na América Latina ter sido, desde os seus primórdios, incompreendido, não apoiado, censurado, desvalorizado, por amplos círculos internacionais, até os nossos dias. Foi nesse contexto que a hoje festejada e centenária “Conferência Missionária” de Edimburgo, de 1910, nos excluiu como terra de missão.

Somos vistos, ou tolerados, como os exóticos bem sucedidos, a exceção que deu certo.

Essa manhã, devemos homenagear os pioneiros do protestantismo de missão, tanto estrangeiros quanto nacionais, que, movidos por uma visão, uma paixão e uma doação, aportaram no Brasil na segunda metade do século XIX, pretendendo nos trazer uma fé superior, a democracia e o progresso, em clima de respeito mútuo e cooperação, enquanto procuravam impactar a Sociedade e o Estado, primeiro sob as draconianas restrições legais do Império, depois sob violentas perseguições sociais no período republicano. Aqueles pioneiros – escatologicamente pós-milenistas ou amilenistas – se tornaram abolicionistas, republicanos, defensores da separação entre Igreja e Estado, criadores de uma rede notável de educandários, que marcou vidas e forjou lideranças em todo o território nacional: congregacionais, presbiterianos, metodistas, batistas, episcopais, cristãos evangélicos. Colhemos hoje com alegria o que eles um dia semearam, parafraseando Churchill, com “sangue, suor e lágrimas”.

Nossa homenagem aos “derrotados” na Conferência de Edimburgo, que, inconformados e convictos, organizaram o Congresso de Ação Cristã na América Latina, do Panamá, em 1916, reafirmando esse continente, nominal e sincrético, como terra de missão, e que a missão deveria se fazer em unidade. Nossa homenagem, também, aos brasileiros, como Erasmo Braga, em 1920, a Comissão Brasileira de Cooperação, o Conselho Nacional de Educação Religiosa e a Federação de Igrejas Evangélicas do Brasil, embriões de um movimento pela unidade protestante em terras brasileiras.

Nossa homenagem, ainda, aos visionários, que transformaram aquelas entidades em um dos primeiros organismos nacionais aglutinadores e representativos do protestantismo em todo o mundo: a Confederação Evangélica do Brasil, criada em 1934, com seus vários departamentos, tendo à frente notáveis líderes e pensadores, que escreveram uma epopeia, até a crise que levou ao seu encerramento, no turbilhão de controvérsias ideológicas e teológicas que marcaram o período da chamada “Guerra Fria”, bem como o Golpe Militar de 1964, e o período discricionário que a seguir infelicitou a nossa nação.

Nossa emocionada homenagem aos mortos, aos torturados, aos desaparecidos, aos exilados, aos marginalizados (incluindo nossos fiéis) em um momento de penitência por uma Igreja que pecou ao se deixar instrumentalizar pelos poderes desse mundo.

Nossa homenagem a cada homem e mulher, tantas vezes anônimos, que mantiveram firmes a chama da unidade na verdade, mesmo diante das adversidades e das polarizações, com suas pressões, tentações e riscos internos e externos.

Nossa homenagem àqueles que lutaram por transformar a outra expressão do protestantismo, o de migração, também em protestantismo de missão, em acercamento às igrejas morenas.

Nossa homenagem àqueles que lutaram por retirar o pentecostalismo – ator posterior - do seu isolacionismo, em grande parte consequência da sua escatologia, e dar passos corajosos na direção dos históricos, de missão ou de migração, em uma atitude de mútuo respeito e mútua aprendizagem, inclusive sarando as feridas das controvérsias da “renovação” dos anos 1960. Nossa homenagem particular ao saudoso estadista da Assembleia de Deus Alcebíades Vasconcelos.

Estamos convencidos de que é dessa convergência em torno da ética, da sã doutrina e da missão integral da Igreja, que históricos, migratórios, pentecostais e renovados, poderão reviver e retomar a epopeia interrompida e inacabada, sempre necessária, e sempre urgente, pois sempre no coração de Deus.

Nossa homenagem aos que compareceram ao Congresso de Berlim, em 1966; à fundação da Fraternidade Teológica Latinoamericana, em Cochabamba, em 1970; ao Congresso Lausanne I, em 1974, muitos deles já integrando a Igreja Triunfante.

Lamentamos o longo hiato à causa da unidade, depois do fechamento da Confederação Evangélica. Lamentamos o longo hiato que se seguiu ao Congresso de Lausanne I, por tantos anos incompreendido, por setores polarizados de nossas igrejas. Nossa homenagem ao missionário norte-americano Lawrence Olson, da Assembleia de Deus, responsável pela primeira publicação do Pacto de Lausanne em língua portuguesa.

Sem negar a memória e o legado mais antigo dos CELAs, registramos a importância mais recente dos Congressos Latinoamericanos de Evangelização, os CLADEs, a criação da Comissão Brasileira de Evangelização (CBE) e a realização dos Congressos Brasileiros e Nordestinos de Evangelização. Passos importantes, tijolos vivos, nessa penosa tarefa de reconstrução.

Nossa homenagem aos que tentaram, e deram o melhor de si para a experiência válida que foi, nos anos 1990, a Associação Evangélica Brasileira, a AEvB, cujas principais fragilidades foram a demora para o seu início e o modelo de sua gestão, mas que não podemos nem apagar a história, nem sermos ingratos ao que de positivo se fez, destacando-se o seu “Decálogo do Voto Ético”.

Que lições podemos extrair desse rico passado?

Para mim, após mais de meio século no protestantismo brasileiro, ficaria uma querida palavra da língua portuguesa: saudade. Saudade de quando éramos um número não escandaloso de “denominações”. Saudade quando todos confessavam a sã doutrina. Saudade do sonho comum da unidade. Saudade da seriedade, da reverência, da solenidade, da disciplina (inclusive intelectual). Saudade da ética. Saudade da imagem positiva e da boa reputação. Saudade de quando o termo “evangélico” significava a mesma coisa para todo o mundo. Saudade quanto tínhamos uma representatividade e uma voz ouvida e respeitada. Com diria minha avó, entre suspiros: “bons tempos aqueles...”. E espero que não me entendam nem como um idealista ou um saudosista, mas como quem presenciou e vivenciou experiências, e para elas foi atraído.

Os tempos são outros, os desafios são velhos e são novos, a História está para ser escrita por novos atores, por uma nova geração.

Por um lado, como missionários, estamos presentes em todos os continentes, e temos uma responsabilidade de estreitar relacionamentos tanto com a América Latina, quanto com os países de expressão portuguesa. Temos quadros, recursos e não sabemos o que fazer. Vejo com satisfação a nossa integração à crescente família da Aliança Evangélica Mundial. Com o caos que caracteriza a chamada “comunidade evangélica” brasileira, que nem é comunidade e nem sempre é evangélica, temos que ser modestos em nossa capacidade inicial para aglutinar e agregar. Mas, por outro lado, não podemos nos mover pelo excesso de timidez. Juntemos os que querem se juntar, e juntemos com coragem, vendo a audácia irmanada ao bom senso como virtudes irmãs e inseparáveis.

Necessitamos vencer essa marca maléfica do neo-platonismo com seu anti-institucionalismo. Organismo e organização são duas faces da mesma moeda, dentro do mandato cultural que o Senhor nos confiou. Queremos membros de carteirinha, sem preconceitos contra as carteirinhas...

E, por favor, vençam a marca maléfica do temor de que esse novo foro vá além do intercâmbio e de ações comuns, e assuma o seu papel irrecusável de ser representativo. Não somos a única voz, mas somos uma voz, uma voz respeitável, diante de tantas falsas vozes ou do silêncio culposo da ausência de vozes. Convictos, e sem sentimentos de inferioridade ou de vergonha, de portar o termo “evangélico”, em sua reafirmação da autoridade das Sagradas Escrituras, sua centralidade na cruz de Cristo, na experiência de conversão e no mandato missionário.

Nós, da “velha guarda”, não ficamos apenas nas homenagens ao passado, na saudade, no chamamento às lições vividas, no apontar para um rico legado, para a lembrança de nomes e de feitos – por mais importantes que sejam – mas gostaríamos de viver esse momento a partir de um outro sentimento: o sentimento da esperança. Esperança naquele que faz nova todas as coisas. Esperança na Providência. Esperança no Senhorio de Cristo sobre a História e sobre a Igreja. Esperança na resposta dos que são chamados a tornar o Evangelho relevante para sua geração, promovendo a unidade e a inculturação da Igreja, uma Igreja encarnada e verde-e-amarela, não dividida, não irrelevante, não mimética de modismos forâneos

E como as gerações têm respondido ao chamado de Deus e da História?

Algumas se notabilizaram pela obediência e pela relevância; outras pela desobediência e trágico legado, enquanto algumas, e com frequência, desobedeceram pela omissão.

Que a memória dos nossos maiores antepassados seja dignificada!

Que o Senhor confirme a obra de vossas mãos. E que a bênção do Deus de Abraão de Isaque e de Jacó; o Deus de Kalley, Simonton, Kinsolving e Berg; o Deus de Eduardo Carlos Pereira, de Munguba Sobrinho, de Jerônimo Gueiros, de Aurélio Viana e Lisâneas Maciel, vos abençoe e vos guarde nesse dia e para sempre. Amém.

Oremos:

“Recebe, ó Senhor, nós te rogamos, as orações da tua Igreja, hoje quando nos lembramos dos teus servos e servas, e de sua luta em nosso País em favor do Cristianismo Reformado. Concede a todos nós a coragem desses irmãos do passado, para que lutemos com fé e coragem pela fé uma vez dada aos Santos. Mediante Jesus Cristo, nosso Senhor, que vive e reina contigo e o Espírito Santo, pelos séculos dos séculos. Amém”.



* Robinson Cavalcanti, bispo da Diocese do Recife – Comunhão Anglicana, cientista político, escritor e bispo anglicano, ex-assessor da Aliança Bíblica Universitária do Brasil (ABUB), foi membro fundador e integrante da Comissão Executiva da Fraternidade Teológica Latinoamericana (FTL), da Comissão de Convocação e da Comissão de Continuação (LCWE) do Congresso de Lausanne, da Comissão Teológica da Aliança Evangélica Mundial (WEF) e da Comissão Executiva da Fraternidade Evangélica na Comunhão Anglicana (EFAC). Palavra à ACeB na manhã do dia 30/11/2010.