domingo, 24 de maio de 2015

Umas e outras (Férias, igreja, Convenção, Lula, Malafaia, ovos, mortadela, VEJA, cientistas...)

Gláucia perguntou-me o que iria fazer. Respondi que iria escrever, como terapia. É assim: uns pescam, outros ficam na rede, outros escrevem... Cada um faz o que lhe dá prazer com seu tempo livre.
Férias, igreja e Convenção
Hoje, posso dizer, é meu último dia de férias. Amanhã volto à rotina: aula no seminário, palestra para missionários em seu retiro anual, texto para boletim, estudo bíblico para quarta-feira, mensagens para o domingo, agenda de aconselhamento, reunião com ministros e, enfim, o que ocorrer na família, igreja, Convenção...
Férias é um tempo bom. A igreja merece. Eu também.
 Fazia tempo que não tirava 30 dias corridos. A última vez que fiz isso foi para dedicar-me integralmente à Convenção Batista. Tempos difíceis, mas superados. Diga-se de passagem, em 3 anos, pela primeira vez fiquei 21 dias sem acessar as contas bancárias da Convenção. Com a situação sob controle e mais de uma pessoa controlando, não me arrependi.
 Estamos terminando maio, período historicamente difícil pras finanças da CBBA, sem dever nada a ninguém, com os salários dos missionários que vencerão dia 30 já pagos e com perspectivas que trarão muita alegria ao povo batista baiano. Isso, claro, graças à fidelidade das igrejas e a uma equipe de funcionários nas diversas áreas com o coração e a cabeça na obra.
Voltando à igreja, cheguei de viagem e já dei uma passada por lá. Coisas boas estão acontecendo e desafios também.
Lula e Malafaia
 Acompanhei nesse final de semana, o debate Lula x Malafaia. Lula precisa conversar um pouco com Pelé, com Xuxa, especialmente se pretende concorrer novamente à presidência. Se não fizer isso, visando administrar melhor a imagem, as coisas ficarão mais difíceis.
Dessa vez, segundo se noticiou tanto na mídia do alto, quanto do baixo clero, na de chapa branca e na marrom,  ou, se preferirem, na da Casagrande e da Senzala, ele fez comentários jocosos com pastores neopentecostais que mexeu com os brios da população dita evangélica. De repente esqueceu-se de que a maioria do povo chamado evangélico é feita de empobrecidos, seu nicho eleitoral.
Malafaia, em seu papel de comentarista político de religião  mandou ver. (Não estranhe. Não é demérito ser comentarista de religião. Há comentaristas de economia, de futebol, de gatos e cachorros, enfim, nada demais nem de mal, um comentarista de religião). Com sua capacidade indiscutível de comunicar-se, de articular as palavras, de defender seu nicho, como Lula defende o seu, Malafaia  mostrou com quantos paus se faz uma canoa.
 Negando a acusação que Lula teria feito, de que pastores neopentecostais atribuem tudo ao diabo, não só discursou contra essa idéia como denunciou um monte de maracutaias que o PT, não o diabo, teria feito. Disse que a única paternidade do diabo declarada na Bíblia seria a mentira e, portanto, diante da mentirosa campanha eleitoral do PT e das negações de Lula de nada saber em relação à corrupção, classificou-os como filhos do Dito Cujo. Finalizou, com um apelo que pode ser chamado, no contexto, de “tiro de misericórdia”: declarou que não odeia Lula e que Jesus tem poder para libertar da cachaça quem o aceita.  Pronto, em nome de Jesus xingou Lula de pinguço, como se dizia lá em Garrça, na minha longínqua infância.
Lula deixou de representar minhas expectativas políticas por reformas estruturais há algum tempo; Malafaia nunca me representou. Acompanhando esta discussão, choro mais do que rio. Choro pelos de esquerda que Lula declara defender, choro pelos pobres dos pastores evangélicos que Malafaia auto declara-se representar. Choro pelos dois lados: por ter sido rotulado ao longo de minha vida como evangélico e de esquerda.
Ovos, mortadela, VEJA e cientistas
 Nessa semana senti vontade de comer mortadela. São as lembranças do meu lado paulista. Comprei meia dúzia de fatias, passei um pouco de manteiga num pão francês, coloquei uma fatia de mortadela dentro e curti  lembranças de padarias e botecos da minha adolescência em Garrrça.
Comprei também meia dúzia de ovos, caros, no Bom Preço. Cresci comendo ovos. Ovos fritos, batidos, cozidos na água e no feijão, na salada. Gosto de bater um ovo com cebola e Orégano e comer como omelete. Delicioso. Naquele tempo não se questionava a “saudabilidade” dos ovos, até porque havia dias em que eram a única “mistura” do almoço, graças às galinhas criadas no quintal.
Depois veio a conversa de que a ciência destacava seus malefícios. Continuei comendo.
Não costumo dar ouvido a discursos só porque estão embalados em batas brancas e óculos de grau. Já pensava assim antes de ler “Filosofia da Ciência” e “Entre a ciência e a sapiência”, ambos de Rubem Alves. Lê-los ajudou-me a organizar melhor meus pensamentos nessa área.
Nada contra a ciência. Tudo contra a absolutização dela, como linguagem única para se entender e se relacionar com a vida.
Voltando aos ovos. A chamada de capa da VEJA (sim, minha insegurança política não é tal, a ponto de não ler Veja).  diz: “OVO. Depois de muito vai e vem, a ciência finalmente dá o diagnóstico: ele faz bem”. Ri. Eu já sabia. Sinto muito pelos teleguiados que deixaram de comer ovos, só porque a “ciência”, irmã gêmea do “mercado”, disse ou deixou de dizer.
Abro as páginas amarelas da revista e lá está uma entrevista publicitária com Richard Dawkins. Ele está lançando mais um livro no Brasil e se VEJA prepara o caminho do lançamento com a presença dele, é sucesso de vendas num segmento. Dawkins, professor de Oxford, decidiu construir um caminho literário num nicho pouco explorado comercialmente: a defesa do ateísmo. Se deu bem comercialmente.
O problema da teoria de Dawkins é igual a dos ovos. Tem um monte de gente que só acredita no que a ciência diz, por isso para de comer ovos. Se um cientista diz que Deus não existe, serei ateu. Não importa as diferenciações filosóficas muito bem feitas por Paul Tillich entre ser e existir. Não importa a reflexão de Carl Jung sobre a incapacidade da parte explicar o todo. Muito menos importa se, por razões que não vem ao caso, Dawkins decidiu dar um corte epistemológico em seu trabalho, decidindo não entrar no terreno dos “fatores desconhecidos e aleatórios” como ele diz. Ora, se optou por não entrar neste terreno, por que abraçou o discurso do ateísmo? Discursar-se como ateu é apenas o outro lado da moeda da reflexão sobre “fatores desconhecidos e aleatórios”, repito, como ele diz. É uma forma de encarar e se relacionar com o mistério.
Agora, o fato dele ter optado por desconsiderar Deus em seus estudos, de ser cientista de Oxford, de defender o ateísmo, de ser entrevistado nas páginas amarelas de VEJA, não me impedirá de comer ovos. Ele faz a escolha dele com os critérios que escolheu, eu faço as minhas com os meus. Ele responde por ele. Por mim respondo eu. Sem crise.

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