quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

Filhos "obedientes", pais condecorados

Cresci convivendo com pais orgulhosos por seus filhos estarem integrados em uma igreja e pais tristes, pelo contrário.

Vez por outra ouvi pastores encherem o peito no púlpito ao declararem que seus filhos estavam "nos caminhos do Senhor" e ouvi pastores sendo criticados sob o discurso de que o "insucesso" pelas escolhas dos filhos, diferentes das deles, os desqualificava  para o pastorado, afinal, "biblicamente", "quem não sabe governar a sua própria casa, como terá cuidado da Igreja de Deus?"

Isso me faz lembrar de um pai que criou um casal de filhos, deu-lhes as diretrizes para o bem viver, mas ambos seguiram por outro caminho. Um de seus "netos" matou o irmão. Esse era nada mais nada menos que o todo poderoso, criador do universo.

Talvez, lembrar isso ajude na redução do juízo precipitado, da jactância, da exigente hipocrisia ou ainda, até, do sentimento de culpa e desistência de alguns do ministério.

Há certas bandeiras que levantamos para nos fortalecermos moral e politicamente perante um público ou para enfraquecer alguém com quem não simpatizamos ou cujas idéias não nos agradam ou não nos beneficiam, sem prestarmos atenção no fato de que o padrão usado para acariciar e alimentar  o próprio ego é mais elevado do que o experimentado pelo próprio onipotente, onisciente e onipresente "Pai do Éden".

É bom e agradável ver os filhos seguindo os princípios que abraçamos. Investir nisso é indicado, especialmente se o resultado que se pretende é criar filhos amorosos, respeitosos, solidários, trabalhadores, enfim, retratos da imagem de Deus manifesta em Jesus.

Mas é bom  também sermos mais humildes, graciosos e respeitosos - como Jesus - na forma de lidar com o "sucesso" ou "insucesso" nessa área. Primeiro, porque a história ainda está sendo escrita e o balanço final não ocorreu; depois,  pra não nos colocarmos como mais sábios, exemplares e eficazes do que o próprio Deus, pai-criador, que apregoamos.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

Natal, bendita sensibilidade

“Em tudo o que fiz, mostrei a vocês que mediante trabalho árduo devemos ajudar os fracos, lembrando as palavras do próprio Senhor Jesus, que disse: ‘Há maior felicidade em dar do que em receber’ ”.” (Paulo, em Atos‬ ‭20:35‬)

O que é que nos torna, de uma maneira geral, mais sensíveis no Natal? Parece-me que é o espírito de dar, reinante na estação.

Neste período, independente de qual motivo se alegue, o fato é que há uma mobilização coletiva no sentido de sair de si mesmo, de lembrar-se do outro e de como se pode fazer para agradar alguém.

Seja através da doação de um presente, do compartilhar de uma ceia, de uma moedinha na "caixinha de natal", de uma libertação para si mesmo ao oferecer perdão a ofensor, enfim, o fato é que o espírito coletivo se abre para dar.

Isso faz com que surja um brilho no coração, um sorriso no rosto, luzes na cidade e emersão de esperança do fundo de nossa alma, possibilitando que aquilo que ansiamos dê sinais de tornar-se realidade.

Critique-se o comércio, a hipocrisia, a artificialidade, a superficialiade, enfim. Nem isso, entretanto, é capaz de impedir que luzes brilhem não só na fachada dos prédios, nas salas de nossos lares, mas sobretudo em milhares de rostos conhecidos ou anônimos ou mesmo em faces cujas almas vivem a maior parte do ano às escuras, com cheiro de mofo, umidecidas em lágrimas.

Respeite-se mesmo aquelas pessoas para as quais o Natal nada signifique ou signifique coisas diferentes de seu motivo original. Nem elas, mesmo sentindo e reagindo de forma avessa, conseguem passar incólumes neste tempo do nosso calendário.

Dar é o espírito do tempo. "Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu seu filho unigênito, para que todo aquele que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna". (Jo. 3:16)

Se é assim, e assim eu creio, o Natal é uma lembrança, uma sinalização para o caminho da vida, para o pão da ceia a ser compartilhado, à porta aberta pela qual devemos entrar, a fim de que os dias que estão por vir sejam melhores do que os vividos, para todos.

Receber e compartilhar o presente divino, esse é o sentido do Natal. Daí trocarmos presentes, inclusive imateriais. Esse é o espírito da estação. Isso, parece-me, repito, é o que nos torna a todos, conscientes ou não, aceitando ou não, mais sensíveis. Bendita sensibilidade.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

"Sabedoria" e "Inteligência Emocional"?

Há quem apregoe que "sabedoria" e "inteligência emocional" são característicos daqueles que não se envolvem em conflitos de natureza política, inclusive os de natureza político-religiosa ou político-eclesiástica ou ainda político-denominacional. Esse tipo de "sabedoria" e "inteligência emocional" (ou a falta delas) seriam a causa de, no popular, alguém se dar bem (ou se dar mal) na vida.

Reconhecidas as exceções patológicas, ninguém se envolve em conflito porque gosta, muito menos porque gosta só de si. Se envolve porque enxerga e acredita que há algo nocivo, doentio, na formatação estrutural, política, ideológica, enfim, do grupo ao qual pertence que precisa ser corrigido, curado, elucidado. Se envolve porque persegue o bem não só pra si, mas também para todos.

Se "sabedoria" e "inteligência emocional" fossem ser capaz de nunca se envolver em conflito, que classificação daríamos à pessoa de Jesus? Ou à pessoa de Paulo? Ou será que  ignoramos as narrativas abundantes dos conflitos de Jesus com Fariseus, de Paulo com comerciantes e religiosos? Teria sido por nada que um foi parar na cruz e o outro atrás das grades?

Se por comodidade, medo ou outro até bom motivo alguém valoriza e, por isso, prioriza nunca envolver-se em conflito, essa é uma escolha que deve ser respeitada. Até mesmo escolher ser um covarde vivo a um herói morto seria legítimo. Cada um sabe onde seu sapato aperta e reconhece até onde é capaz de ir.

Daí, entretanto, "sinonimizar" a escolha de nunca envolver-se em conflitos como "sabedoria" ou "inteligência emocional" soa-me muito mais como conversa pra King (o Martin, não o monarca) dormir do que verdade.

Faça um levantamento na história de quem fez diferença no desenvolvimento social da humanidade ou de um segmento dela ou mesmo em um pequeno grupo e descubra o percentual desses que seriam classificados como "sábios" ou "emocionalmente inteligentes", segundo a definição pacifista. Se o percentual não for zero, chegará próximo disso.

A história daqueles que fizeram diferença social na caminhada de um grupo, de uma sociedade, demonstra que, sim, eram "sábios", "emocionalmente inteligentes". Apenas o escalonamento de seus valores tinha sequência diferente, com outra prioridade.

Eles decidiram não viver só pra si, só pra preservar  emprego,  salário,  posição social ou privilégios.  Antes, tiveram um senso de justiça social, sentiram a dor dos enfraquecidos, empobrecidos ou fragilizados pelos sistemas, eram empáticos, compassivos, corajosos e focados.

Eles pensavam no que precisava ser feito e em como fazer pelo bem de todos e agiam, mesmo que isso lhes custasse perda de privilégios, do status quo, da vida. "É preciso obedecer antes a Deus do que aos homens!” (Atos‬ ‭5:29‬), acreditavam.

Todo relacionamento é conflituoso. Cabe, portanto, a cada um, e é desejável e recomendável que assim seja, desenvolver a capacidade de buscar a harmonia através de diálogo, negociação, acordo, visando o maior benefício para todos, pelo menor custo emocional, político, etc, possível.

Mas, se os privilégios inaceitáveis de uns são mantidos a base dos sofrimentos inaceitáveis de outros, nada resta a ser feito senão preparar-se pra cruz ou pra prisão, com muita "sabedoria", "inteligência emocional", mas também altruismo, coragem, competência e muito amor ao próximo.

A alternativa a isso seria, "pilatianamente", "lavar as mãos", mantendo-se com curriculo "limpinho", com aparência de "cidadão de bem", de "bom mocismo" e, com "sabedoria" e "inteligência emocional", passar os dias sentado "no trono de um apartamento com a boca escancarada cheia de dentes esperando a morte chegar".


quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

O cristão e os empobrecidos

As eleições passaram. Bolsonaro será o presidente.

Sugiro duas coisas:

1. Não aja como alguns petistas agiram quando estiveram no poder: aplaudiram os acertos e silenciaram nos erros.

Se assim agir, será apenas um petista ao avesso, com todos os defeitos do avesso.

Aja como cristão, como sal e luz. Olhe as ações do governo com consciência crítica. Não uma crítica emocional de desabafo, mas racional, mesmo quando indignado.

2. Enquanto houver pessoas muito satisfeitas com a vida econômica que levam, talvez como vc, e houver 1 brasileiro ou mais de 50 milhões, como indicam as pesquisas, sobrevivendo com 400 reais por mês, haverá um seguidor de Jesus, em meio a milhões de cristãos acomodados, clamando por justiça social, mesmo sendo pejorativamente rotulado de socialista, comunista, petista, reacionário, esquerdopata, como tentativa de amedrontá-lo, marginalizá-lo e calar sua voz.

Lembre-se do que disse Jesus: se os crentes se calarem, as pedras clamarão.

Ósculos e amplexos.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

Economia política

Há muito  tempo, como pastor, professor e exercendo cargos de liderança denominacional batista venho falando que um dos problemas do ministério pastoral está na deficiência de estudos teológicos mais profundos no campo da ética relacionados à política e economia.

Há uma ênfase na ética corporal e familiar em detrimento da política e econômica. Por isso, nós pastores nos sentimos empoderados para tratar desses dois campos - corporal e familiar - e silenciamos em termos de ética política e econômica.

Pior, quando o assunto são os problemas da família, eles são julgados estritamente pela ótica do padrão moral - não necessáriamente ético - corporal, como se política e economia não influenciassem a saúde e estabilidade da família e seus indivíduos. Isso gera profundas distorções nas orientações que brotam dos púlpitos e das salas de aconselhamento pastoral.

Por isso fiquei maravilhado com este texto. 

Recomendo.

(http://www.lupaprotestante.com/blog/economia-politica-para-teologos-y-cristianos-con-interes-1-alfonso-ropero-berzosa/)