terça-feira, 25 de novembro de 2008

Alternância no poder


“É tarefa de cada geração preparar seus substitutos, os líderes que tornarão possível o progredir da humanidade”
Merval Rosa

Jesus foi claro ao ensinar que o exercício do poder pelos discípulos deveria ser diferente do adotado pelos políticos da sociedade. Reis dominam, discípulos servem. (Lc. 22.25-26). Naquela época, o sistema era monárquico, autoritário e contínuo. Hoje estamos em estágio avançado de democracia, com possibilidade de alternância no poder. Isso nos permite escolher os que servem melhor.

O exercício do poder tem um apelo muito mais profundo do que a pratica do serviço. Daí a luta pela ocupação e manutenção do poder, bem como a resistência à política de alternância.

A alternância é saudável em todos os níveis eclesiásticos, inclusive no pastorado, na igreja local. Há denominação que resolveu isso definindo que, a cada “xis” anos, suas igrejas se manifestam sobre a permanência ou não de seus pastores. Caso a igreja decida não reconduzir, o pastor recebe suporte financeiro por período definido de tempo a fim de que possa manter-se e arrumar outra fonte de sustento.

Em tal denominação, além do sistema oferecer apoio ao pastor, todas as igrejas são obrigadas a adotar o mesmo procedimento de eleição por tempo determinado. Já no sistema batista, as convenções não têm poder de regulamentar o funcionamento das igrejas, pois elas são autônomas. Portanto, esperar algo parecido com a citada denominação é pouco provável, pra não dizer impossível. Daí as experiências geralmente traumáticas, sempre que uma igreja decide substituir seu pastor.

Raras igrejas batistas copiam o modelo de pastorado por tempo determinado, mesmo com direito ilimitado a reeleição, e destas, não conheço uma que ofereça garantias de manutenção financeira em caso de substituição. Por isso, pastor com juízo, que depende exclusivamente do ministério, sabendo que a maioria absoluta das demais igrejas não adota tal política, reluta em aceitar tais pastorados.

Na Assembléia da CBBA, em Itabuna, alertei para a ilegalidade da recondução de pessoas ao Conselho. A recondução, além de ferir o princípio salutar da alternância, é visivelmente ilegal. O Estatuto diz que o Conselho deve ser renovado em 1/3. O conceito é matemático. 1/3 de 18 é igual a seis. Logo, qualquer número inferior a seis contraria o Estatuto. Mesmo que o Regimento deixasse alguma brecha, ela deveria ser desconsiderada, pois o Estatuto revoga disposições em contrário.

Agora, na Assembléia de Ipiau, novamente a legalidade foi ferida. O Estatuto da CBBA é cristalino: “Fica vedada a reeleição dos membros da diretoria, para terceiro mandato consecutivo” (Art. 15, Par. 6º). Uma pessoa pode ocupar somente duas vezes consecutivas uma função na diretoria. Ponto! O que passa disso é ilegalidade.

A pratica da recondução nesses casos da CBBA, além de nociva ao princípio de alternância e de renovação, é ilegal. E se nós compactuarmos com a ilegalidade, enfraquecemos nosso moral para falarmos em ética na vida pública. Por isso, seria interessante que o Conselho se manifestasse sobre o assunto para ficar claro que não é conivente com tal prática.

Defendo que nossos legisladores – vereadores, deputados e senadores – deveriam ter direito a somente uma reeleição consecutiva, como ocorre no Executivo. Algo semelhante deveria ser adotado para os juizes do STF. A alternância no poder é extremamente saudável, pois além de evitar vícios que os anos no cargo acarretam, abriria, ainda, espaços para que o sistema ficasse mais arejado.

Poucas pessoas se dispõem a estar constantemente abertas a enxergar a realidade usando novos paradigmas. Isso, entretanto, é essencial à saúde e desenvolvimento da vida. A alternância no poder não é uma garantia disso, mas aumenta a probabilidade de se enxergar as teias de aranha e sentir o cheiro de mofo que deixamos de perceber, pela permanência prolongada no poder.

Mas, se é um desafio hercúleo implementar e manter a alternância, em nossas relativamente pequenas estruturas batistas, nas quais as funções deveriam ser ocupadas, em tese, pelo desejo de servir e não pelas benesses do poder, como lutar por isso nas estruturas da sociedade? Como defender tais teses se não dermos exemplo em nosso chamado democrático sistema eclesiástico?


0 comentários: