quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Sofrimento e graça na vida de Maria


"O anjo, aproximando-se dela, disse: "Alegre-se, agraciada! O Senhor está com você!" Maria ficou perturbada com essas palavras, pensando no que poderia significar esta saudação. Mas o anjo lhe disse: "Não tenha medo, Maria; você foi agraciada por Deus!" (Lc. 1.28-30) 
 
Se tivesse que indicar o ser humano cujo nome esteja mais conhecidamente associado à graça divina, certamente o de Maria seria o primeiro. Isso porque, além de sua história em si, diariamente, em cada canto do planeta alcançado pela Igreja Católica, pelo menos uma vez por dia se veicula em emissoras, a prece:
“Ave Maria,
cheia de graça,
o Senhor é convosco,
bendita sois Vós entre as mulheres,
bendito é o fruto em Vosso ventre,
Jesus.” 

Em poucas das histórias publicadas na literatura cristã, graça e sofrimento se misturaram de maneira tão explicita quanto na de Maria.

Imagino não ter sido fácil, na condição de solteira, esclarecer sua gravidez, numa sociedade com característicos diametralmente opostos, em quase todas as dimensões, aos dos nossos dias. Creio mesmo que, diante da dolorosa experiência, ela se sustentava nas palavras: "Não tenha medo, Maria; você foi agraciada por Deus!” 

Em estado avançado de gravidez ela precisou viajar para atender uma exigência legal de recadastramento. O trecho era longo, as estradas de terra não eram feitas nem mantidas com as tecnologias hoje disponíveis, não havia estrutura sanitária como conhecemos, nem os meios de transportes podiam se equiparar até mesmo às carroças que poucos de nós conhecem “ao vivo”. Mas, certamente, diante do sofrimento ela lembrava-se: "Não tenha medo, Maria; você foi agraciada por Deus!” 

Distante de sua casa, num lugar onde conhecia poucas pessoas e ainda sem estruturas adequadas para hospedar-se, chegou o tempo de dar à luz. Isso se deu num espaço construído para abrigar animais e uma cocheira foi usada como berço para seu bebe. Certamente as dores provocadas eram aplacadas pela declaração: "Não tenha medo, Maria; você foi agraciada por Deus!” 

Ter que fugir para o Egito, diante da determinação de Herodes de tirar a vida de seu bebe, deve ter sido angustiante. Não somente em decorrência dos efeitos dolorosos de mais uma viagem nas condições de então, com uma criança nos braços, mas também porque sabia que todos os meninos de sua cidade e região seriam exterminados “por causa de seu filho”. À dor física, somou-se a experiência emocional tão bem descrita por Mateus: 

"Ouviu-se uma voz em Ramá, choro e grande lamentação; é Raquel que chora por seus filhos e recusa ser consolada, porque já não existem" (Mt. 2.18) 

Suponho que, em mais essa experiência de sofrimento, suas dores eram acalentadas pela mensagem: "Não tenha medo, Maria; você foi agraciada por Deus!” 

Quando seu filho, já adulto, sofreu as dores da crucificação, João escreveu: 

“Perto da cruz de Jesus estavam sua mãe,...” (Jo 19.25) 

Penso que, enquanto sofria diante de tamanha tortura, sua vida era sustentada pela voz que não silenciava em seu coração: "Não tenha medo, Maria; você foi agraciada por Deus!” 

A graça divina não nos torna imunes ao sofrimento; antes, em meio a ele, revigora nossa esperança. Firmados nela compreendemos que, se no mundo teremos aflições, o ânimo não deve ser perdido, pois assim como Jesus foi vitorioso também poderemos ser. (Jo. 16.33).

A experiência da graça, esse sentimento misterioso que toma conta do nosso ser excedendo todo o entendimento é o elo que nos mantém unidos ao mistério da vida, ao “absolutamente outro”, àquele que se convencionou chamar de DEUS. Sua manifestação entre nós na pessoa do Cristo, relembrada no Natal, é consolo, força e “lâmpada para nossos pés, luz para nossos caminhos” em meio às trevas do sofrimento.

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