quarta-feira, 14 de março de 2012

Dialogando e refletindo para sermos melhores


Há quem acredite que a história seja linear, isto é, que ela acontece de maneira lógica, progressiva, com início, meio e fim. Fim feliz, de preferência, claro. Entretanto, a própria história nos mostra que as coisas não são bem assim. Pelo contrário, vemos que ela se caracteriza por avanços e retrocessos, altos e baixos, rupturas e reatamentos, afirmações e negações, amor, alegria, raiva, tristeza, medo...

A história de cada um e das igrejas não é diferente. O “eu quero dizer agora, o oposto do que eu disse antes...” de Raul Seixas; ou o “esqueça o que escrevi; isso foi há muitos anos, tudo se renova, esqueça”, atribuído a FHC; ou o quando a gente está na oposição, faz muita bravata”, atribuído a Lula; ou o “nossa cabeça pensa onde pisam nossos pés”, atribuído a Frei Beto, conquanto criticado por alguns como sendo sintoma de instabilidade, incoerência, incongruência, falta de integridade, até de esquizofrenia, está presente nas histórias de todos nós muito mais do que imaginamos ou admitimos. Parafraseando Paulo, o adulto não pensa, sente, fala ou age como quando era menino (I Cor. 13.11).

Há três anos resolvi colocar em ordem cronológica, em pastas plastificadas, todos os esboços de sermões que fiz desde 2 ou 3 anos antes da minha chegada ao Seminário Teológico Batista do Norte do Brasil, em 1979, quando não existiam micro-computadores. Enquanto arrumava, perguntei-me muitas vezes: como conseguia pregar com essa estrutura de esboço?  Era assim que eu pensava há 35 anos? Percebi que acontece com o pensamento e sentimento o mesmo que ocorre com o corpo: percebemos as mudanças quando olhamos nossas fotografias.

Quanto mais vivemos, lemos, interagimos e refletimos, com honestidade e humildade, mais aprendemos que também a linearidade de pensamento, sentimento ou condições de vida, em qualquer de suas dimensões, é um mito. A vida é uma tensão saudável e permanente. Se a ausência de tensão, como escreveu Rollo May, é sinônimo de morte, a indisposição para reflexão e dificuldade de adaptação são o aperitivo do fim, a ante-sala do cemitério.

Mudamos, portanto, porque somos seres vivos. Mudamos para melhor e para pior e só nos damos conta disso muito mais pelos desdobramentos, pelo desenrolar da história, do que por uma suposta capacidade superior de avaliar o passado, diagnosticar o presente, planejar, projetar e controlar o futuro.

O importante, então, é não perdermos a disposição para refletir sobre a própria história e a história alheia, retificando ou ratificando referenciais de pensamento e conduta visando tornar nossa caminhada mais agradável (ou, numa ideologia mais pessimista, menos desconfortável). Se errarmos, que aprendamos com o erro e, em vez de ficar lamentando, prossigamos. Se alguém “mexeu no meu queijo”, como diria  Spencer Johnson, ficar amargamente paralisado elegendo bodes expiatórios, não modifica o fato.

Essa compreensão faz com que estudar, refletir comunitária e continuamente, seja algo que “não sai de moda”. Nossos patamares de pensamento e qualidade de vida podem ser diferentes, mas a interação é fundamental, inclusive com divergentes.

Em uma de suas mensagens no programa “Um olhar sobre a cidade”, no Recife, Dom Helder Câmara afirmou: “Se és sincero e buscas a verdade e tentas encontrá-la como podes, ganharás tendo a honestidade e a modéstia de completar teu pensamento com o pensamento, mesmo de pessoas, que te pareçam muito menos inteligentes e cultas do que tu.” E conclui: “Atenção, amigos, nós todos precisamos de matricular-nos na escola do diálogo e começar aprendendo de verdade a ouvir. E fiquemos alertas para a tentação de achar formidáveis, geniais, os que falam de acordo com o que nós pensamos. E de queimar como quadrados, caretas, os que têm a ousadia de discordar de nós. Adotemos como um de nossos lemas, queridos, “se discordas de mim, tu me enriqueces".”

Se acharmos que não mais precisamos disso, lembremo-nos de que o alerta paulino continua vigendo: “aquele, pois, que cuida estar em pé, que julga estar firme, cuide-se para que não caia” (I Cor. 10.12).

1 comentários:

Anônimo 17 de março de 2012 às 19:53  

É, meu caro,Edvar um amigo me disse há muito tempo: "Não escreva um livro antes dos sessenta anos, pois você vai mudar de opinião". Mas se quiser aventurar-se tenha coragem de consertar as bobagens".
Eliezer Lourenço da Silva.