sábado, 6 de dezembro de 2008

Na caminhada da vida

Desço a ladeira da Floriano ainda meio sonolento, enfrento a escadaria, subo à esquerda pelo viaduto da Gabriela. Olho do lado, vejo prédios e um barranco gramado. Olho embaixo e lá está uma família – pai, mãe e filho - sob o viaduto, enrolada em cobertas sujas. Penso na chuva, nas conseqüências e prossigo. Delicio-me com o verde, com a vista do Vale do Canela, com os pássaros e carros.
Subo em direção ao bairro da Graça. Prédios de um lado, prédios do outro e lá num canto, meio escondida, a fonte Nossa Senhora da Graça. Caminho mais alguns metros e estou sob a ponte da pracinha que fica em frente à Igreja Católica. Um amontoado de sacos, colchões, cobertor e em meio a isso, um homem negro, meio calvo, todo despenteado, dorme como se o mundo não existisse.
O sistema de irrigação automático está ligado jogando água de cima na calçada que fica em baixo. Passo correndo e cruzo a parada de ônibus. Vejo mais água molhando a calçada. Aproximo-me, examino o esguicho e corrijo a direção da água. Faço o mesmo com o segundo e atravesso a rua.

A paisagem é agradável. O verde e o vento das árvores impressionam. A temperatura está ótima. A cidade está sonolenta ou sou eu? Desço em direção ao Hospital Português, vejo o flanelinha orientando a madame, e seus colegas, jovens, fortes e desempregados sentados na grama esperando novos clientes.


A ladeira torna-se mais íngreme, mas estou descendo. Vejo o Shopping Barra e uma calçada com diversos lances de escada. Na curva uma menina, adolescente, jovem, senhora, quem sabe? Ela tem um bebe no colo. Ao lado dela uma menina com jeito de 10 anos com outro. Do outro lado um garoto pré-adolescente. Todos sentados.

Passo por perto. Ouço o pedido de moeda pra comprar o pão. Não tenho nenhuma. Confesso que pensei: o que tenho te dou. Levanta-te e anda. Não tive coragem de copiar Pedro. O que faria depois? Prossegui. A curva acabou e me deparei com outro símbolo eleitoral: a Avenida Centenário. Gente esportivamente vestida fazendo caminhada. Carros pra lá e pra cá.

Entro na farmácia. Peço um remédio. A moça está me atendendo, chega alguém e, sem pedir licença dirige-se a ela. Ela pára de me atender e, sem pedir licença, dá atenção ao mal educado. Vou para o caixa, pago a conta e saio.

A senhora chama o táxi. O motorista encosta o carro e fica na dele. Ela tenta abrir a porta. Está trancada. O motorista nem percebe. Seu colega da um grito. Ele olha, abre a porta, ela entra.

Atravesso a rua. Vejo pistas de bicicletas, pedestres, calçadas, bancos, gramados, flores, árvores. Tudo muito bonito, inaugurado às vésperas das eleições municipais. Inicio a caminhada observando o movimento. Gente que sobe, gente que desce. Roupas esportivas coloridas, um mundo ideal.

Passo por um, por dois, por dez e vou me perdendo em meio a tanta gente que aproveita a manhã pra caminhar. De repente ela me olha insistentemente. Uma jovem senhorita, senhorinha, senhora, enfim, uma mulher. Sou homem. Não estou sozinho. A memória me acompanha e acorda a consciência. Sou homem, mas casado, mas pastor e, “pior”, mas me acho cristão. Desvio o olhar. Finjo que não vi. Abaixo a cabeça. Aperto o passo. Mudo de assunto.


A grama está verde e encoberta por folhas. Outro mendigo ou mendiga dorme em meio a sacos. Passo rapidamente. Chego numa curva, num parque. Rapazes sem camisa, uma gaiola, um passarinho um pit bull.



Saio da pista, subo outra ladeira íngreme. Calçadas esburacadas. Parada de ônibus lotada. Camelôs espalhados.

Meu pensamento voa. Lembro-me do irmão reclamando pra mim, por nunca mais ter ouvido sermões sobre o céu ou a volta de Jesus. O porteiro abre o portão. Subo pelo elevador. Sento diante do computador.
Maranata!

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