domingo, 26 de julho de 2020

O verdadeiro Natal (22.12.2019)


Reconheço um quê de pretensiosidade na expressão “o verdadeiro natal”. Não por pressupor que existam falsos natais, o que é facilmente aceitável, mas por dar a impressão de que uma pessoa ou instituição seria capaz de deter o conhecimento absoluto da totalidade de um fenômeno que é multifacetário. Se não ficou claro, explico:
Verdade é um fenômeno, um fato único, irrepetível. São tantas as variáveis envolvidas quando o fato ocorre que o que fica dele são testemunhos, narrativas do fato, da verdade.
Verdade é o fato. O que sobra dele são narrativas. Se várias pessoas testemunharem um mesmo fato, a memória de cada uma registrará elementos diferentes, seja pela diferença no órgão de sentido utilizado (visão, audição, olfato, paladar e tato), seja pela qualidade desses órgãos de sentidos ou dos neurônios que conduzem a informação ao cérebro, seja pelas qualidades do próprio cérebro, seja pela posição geográfico-temporal da testemunha (tempo e distância em relação ao ocorrido), enfim.
A verdade é que, seja por qual variável for, não é difícil compreender e concluir que uma coisa é o fato, o fenômeno, outra é a percepção que testemunhas têm dele e outra, ainda, é a capacidade delas de narrar, seja de forma oral ou escrita, o que testemunhou.
O nascimento de Jesus é um fenômeno, um fato extraordinário. Foi percebido por poucas pessoas. As narrativas disponíveis, de Mateus, Marcos, Lucas e João, não são de pessoas que estavam presentes quando os fatos se deram. Por pressuposto teológico, cremos que esses narradores foram inspirados, cada um através dos meios utilizados, para organizar suas narrativas.
A nós, que também não estávamos lá, cabe crer ou não que as narrativas são relato fiel do ocorrido. Dessa forma a narrativa passa a ser a verdade, o "fato" no qual somos convidados a conhecer, crer, refletir e aplicar, permitindo que nossas vidas sejam afetadas e assim experimentemos uma nova relação com Deus, um novo sentido, a “salvação”.
Ao escolhermos a expressão: “o verdadeiro Natal”, pretendemos apenas destacar facetas das narrativas que não abarcam o todo do fenômeno, mas que afetam nosso modo de viver hoje a partir do contato com a vida do nascido, a razão de ser do natal, o menino de Nazaré que nasceu numa estrebaria.

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