Perdi um amigo
Perdi um amigo. Na verdade não sei se perdi. Na
verdade, já nem sei se poderia dizer que era amigo. Talvez eu o tivesse
por amigo, mas a recíproca não fosse verdadeira.
O fato é que a
relação era antiga e as lembranças eram boas. Mas daí veio o facebook
onde o diálogo não acontece entre duas pessoas, mas dois textos; onde o
diálogo não acontece entre dois rostos, mas duas fotos; onde o diálogo
se estabelece como bate-dedos e não bate-papos; onde o diálogo não
provoca testa franzida, beiço pra frente, pois o rosto está sempre
sorrindo; onde o argumento conta mais do que a relação; onde, portanto, o
"tom da voz" não é calibrado pela reação corporal do outro...
E
se não bastasse a intermediação do Facebook, vieram as eleições.
Históricamente lutamos pelos candidatos do mesmo partido, mas então
decidi que, pelo fato do partido ter se distanciado de alguns
importantes ideais meus, de não concordar com a política administrativa
que, a meu ver, geraria instabilidade financeira, de não..., desoPTei em
relação ao cargo máximo.
Assim, meu suposto amigo esqueceu-se de
nossas histórias, de nossa fé comum, de nossas cumplicidades em
momentos adversos, enfim, e, talvez, por acreditar que a política fosse a
única e suprema dimensão da vida, decidiu me deletar. Sem aviso prévio e
sem indenização.
Minha primeira reação foi propor um diálogo,
mas pensei comigo: bobagem, você o tinha como amigo, mas a recíproca
talvez não fosse verdadeira. Talvez, pra ele, você fosse visto como um
aliado, um networker, um contato útil, enfim. Até porque amizades tem
mais a ver com empatia do que com intelecto, tem mais a ver com
sentimentos do que com razão, tem mais a ver com convivência do que
concordância, tem mais a ver com troca do que com imposição...
Então deixei pra lá. Resignei-me. Fui deletado. Perdi um amigo.
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