sábado, 6 de junho de 2009

Sou batista, sim senhora! (Parte I)

Pois é, senhora, sou batista.

Não tive a oportunidade de ser alguma outra coisa e depois fazer uma escolha, nem lamento por isso. Reconheço apenas que, alguns que passaram por outras confissões e depois se tornaram batistas, tendem a se tornar muito mais, digamos, "orgulhosos" do que outros que, como eu, “nasceram batista”.

Permita-me falar um pouco a meu respeito. Paulo assim o fez ao escrever a “segunda” carta aos Coríntios, nos capítulos 11 e 12. Claro que, imitando Paulo não estou chamando a senhora de corintiana. Entendo que isso soaria duplamente pejorativo vindo de um batista e santista.
Apenas falarei um pouco de mim para que entenda o meu modo de ser batista. Se “a cabeça pensa onde pisam nossos pés” e “a boca fala do que o coração está cheio”, não há como separar nossos pensamentos dos sentimentos alimentados durante nossa história de vida.
Meus pais foram católicos até a adolescência. Ele converteu-se numa igreja presbiteriana, mas, convencido de que o batismo bíblico seria por imersão, passou a ser batista. Ela, até onde sei, converteu-se numa igreja batista.
Diz a dona Nena, com certo orgulho, que não faltou um domingo sequer aos cultos durante todo o período em que estava grávida de mim. Diz ainda que, passada a quarentena, fui apresentado à igreja e ela continuou a não faltar aos cultos. Diz também que assim foi com as seis filhas e dois filhos.

Quando um filho fazia corpo mole, alegando alguma dor, para não ir a um culto, era rigorosamente advertido pelo Seu Jovino, de que, se saísse de casa naquele período, acertaríamos as contas com ele na volta.

Nesse modelo meu caráter foi moldado e, depois, mesmo liberto da fiscalização dos pais, meu superego jamais permitiu ausentar-me de atividades dominicais da igreja sem que uma forte luz amarela acendesse, gerando até certo sentimento de culpa.
Pelas minhas contas são aproximadamente 2700 domingos indo aos cultos, com uma abstenção estimada em 0,5%. Índice nada mal ou nada bom, dependendo dos efeitos colaterais, a senhora concorda?

Não me tornei batista, portanto, por casamento ou comunhão de bens, mas por filiação, hereditariedade. Mesmo tendo conquistado minha carta de alforria, continuei a relação até hoje.
É claro, minha senhora, que uma relação tão longa, firmada inicialmente em algumas imposições carregadas de chantagens sentimentais, não poderia ser amistosa. Daí, talvez, a razão de, diversas vezes, tirar de dentro da própria denominação, os exemplos negativos para ilustrar o que digo ou escrevo.

Imagine: aos 9 anos apresentei-me para batismo, meses depois de ter atendido apelo do então seminarista José Nicolau, posteriormente pastor da PIB de Limeira, SP, para entregar-me a Jesus. Meu pai preparou uma lista de aproximadamente 40 perguntas para eu estudar para a profissão de fé – exame oral visando comprovar as convicções e conhecimentos dos candidatos ao batismo - numa folha amarela, datilografada que guardo até hoje.

No domingo pela manhã, lá estava eu, sentado em uma cadeira ao lado da “mesa da comunhão”, de frente para o plenário, com cada resposta na ponta da língua. O Pr. Olívio dos Santos, de Campinas, que, parece, era pastor interino da igreja, sabatinou-me durante um longo tempo. Respondi tudo direitinho e fui sentar-me ao lado da dona Nena, aguardando o veredito democrático da assembléia.

De repente, irmãs e irmãos começam a dar seus pareceres. Não me lembro se alguém me defendeu. Lembrou-me apenas dos quatro ou cinco que me acusaram. Aos nove anos, a acusação que ficou em minha mente foi de que eu daria muito trabalho pra minha mãe e, por isso, não deveria ser batizado. Depois de adulto vim a entender que o estatuto da igreja exigia unanimidade para alguém ser aceito. Como aos nove anos eu já não era unanimidade, como ninguém é, fui rejeitado.

Descobri, também, depois de adulto, os efeitos que transpareceram imediatamente em minha vida escolar naquele período. Por que estudar, responder tudo certo, se o critério para aprovação era político e subjetivo?

Na escola, na hora da aula de religião, os protestantes eram convidados a se retirarem. Numa turma de 30 alunos, sabe quanto se levantavam? Um ou dois, morrendo de vergonha. Inicialmente ficávamos vagando, marginalizados pelo pátio. Depois passaram a oferecer a alternativa de ensino “protestante” com uma professora presbiteriana.
Na quinta série dei um jeito de fugir da escola e sabe por quê? Porque a professora de matemática, dona Neuza, fazia brincadeiras de mau gosto com um ou dois protestantes da turma. Ir pra aula dela era um terror. Criei um artifício, agora confessado, e me livrei dela, esclareço, da aula, mesmo com prejuízo para minha caminhada escolar.

À época, televisão era raridade, crente de igreja do interior não ia a cinema, baile, carnaval, festa junina, parque de diversão ou estádio de futebol. Isso, numa cidade de 30 mil habitantes era o mesmo que ser ET.

Ser batista, como a senhora pode ver, custou-me um bom preço. Pode não significar nada para um adulto, mas para mim foi dureza.

Mas continuei firme. Graças a meus pais, a bons relacionamentos na igreja e a fé plantada em meu coração, continuei decidido, fui batizado aos 11 anos pelo Missionário Paul Stouffer, hoje aposentado na Geórgia, USA.

Aos 14 anos assumi, pela primeira vez, uma função na igreja, ensinando uma classe de EBD. Daí pra frente, nunca mais fiquei um ano sem compromisso com algum cargo. Professor, líder de jovens, tesoureiro e por aí vai. Aos 18 assumi a primeira função denominacional fora da igreja local, na Associação Centro. E, de lá pra cá, foram raros os anos em que não atuei em organizações de convenções.

Tinha 20 anos quando meu pai morreu. Ele estava de licença médica, se não me engano. Era funcionário da prefeitura municipal. Foi pastor por seis meses, depois de ter estudado no Instituto Bíblico Batista do Estado de São Paulo, em Bauru. Morreu com problema cardiológico no dia 18 de maio de 1978. No dia “30”, a assembléia de membros discutia se minha mãe deveria ou não receber o “salário” referente ao mês de maio. O tesoureiro, uma alemão, defendia que não. Eu, ali sentado ao lado dela, não acreditava no que via e ouvia.
Mas continuei batista, sim senhora! Sem rancor, amargura ou, muito menos, ingenuidade.
Acreditando em vocação, fui estudar no Recife. Desde que lá cheguei procurei engajar-me numa igreja. Jamais fiquei no internato em dia de domingo. Frequentei a IB Vale do Jordão. Depois fui seminarista da IB do Bairro Novo, em Olinda. Em seguida fui trabalhar na IB (da Rua) Imperial. Trabalhei na Convenção Batista de Pernambuco e fui seminarista da IB do Cordeiro.
Após o seminário, continuei minha trajetória na denominação, sempre atuante em igrejas locais e em organizações das estruturas batistas, tanto em nível estadual quanto nacional. Um dia desses organizei cronologicamente todos os esboços de mensagens que preguei desde meados da década de 70 até começar a usar computador e relembrei a infinidade de igrejas, encontros, congressos, acampamentos, seminários e convenções batistas, estaduais e nacional, nos quais preguei na maioria dos estados brasileiros.

A senhora ainda tem dúvidas de que realmente sou batista?

1 comentários:

Pedro Carlos. 7 de junho de 2009 às 01:17  

Gostei das suas respostas. Parabéns.

Gostaria que você comentasse uma postagem do Julio Severo que fala sobre o "Movimento Evangélico progressista", seria de muito valor saber sua opinião, pois depois que li o que ele escreveu, passei a ver com outros olhos certos líderes.

O Titulo da Postagem é:
""Evangélicos progressistas, evangelicais ou encaPeTados?
Gurus da esquerda evangélica brasileira usam diferentes estratégias para camuflar e promover seu evangelho social importado de mestres barbudos""

O Link da postagem:

http://juliosevero.blogspot.com/2009/06/evangelicos-progressistas-evangelicais.html


Muito obrigado pela atenção.

Ps: Esse assunto é de extrema importancia para o povo Batista.