O dízimo
Já dei dízimo por imitação, medo e obrigação. Depois aprendi a fazê-lo por experiência de graça e consciência de causa.
Por imitação, porque cresci vendo meu pai, a despeito do curto salário, sendo fiel na devolução do dízimo; por medo, pois num determinado momento da vida o argumento introjetado em minha mente era que, se não o devolvesse, seria privado da graça de Deus; por obrigação, porque membros da Igreja têm o dever, inclusive estatutário, de sustentar a igreja da qual são parte.
Porém, a melhor das minhas fases de dizimista é a que vivo hoje: a de dar por experiência de graça e consciência de causa. Essa fase é fruto de dois fatores: primeiro, a compreensão da história do dízimo e segundo, a compreensão e engajamento em causas divinas.
Em relação à primeira, descobri que o dízimo não foi criação da Bíblia. Era prática antes mesmo do surgimento do povo judeu. Abraão, que segundo Paulo aparece no cenário histórico 468 anos antes do estabelecimento da lei de Moisés e, portanto da estruturação jurídica da nação judaica, deu o dízimo. Ele o fez num tempo de graça e porque assim se fazia entre os do seu tempo.
Descobri ainda que, no caso de Israel, ele foi criado para sustentar a tribo de Levi. A tribo de Levi era a tribo de Moisés. Essa tribo administrava os interesses do povo judeu. Como Israel se estruturou em bases religiosas, os familiares de Moisés cuidavam dos cerimoniais do templo, além do direito, da saúde pública, da educação, enfim. Então, a fim de que pudesse se dedicar a isso, a tribo de Levi era remunerada pelos membros das demais onze tribos, através do dízimo de tudo o que eles produziam. E, logicamente, tudo isso foi construído usando-se a linguagem religiosa.
Com o advento do cristianismo, uma religião que, em vez de tribal era global, as razões históricas do dízimo perderam o significado. Restou o conhecimento de que Jesus não era contrário à prática do dízimo para as finalidades para os quais ele fora criado e os registros em textos da época, canônicos ou não, de como a igreja-povo procedia para manter-se e alcançar seus objetivos.
Em relação à segunda - compreensão e engajamento em causas divinas -, à medida que fui aprofundando a compreensão da finalidade da existência da igreja, das causas por ela defendidas, da compatibilidade de tais causas com o caráter de Jesus, da possibilidade democrática de administração das coisas da Igreja de tal forma que os recursos fossem investidos em causas realmente divinas, passei a faze-lo com o coração livre e feliz.
Desde que cresci na compreensão da doutrina e de doutrina, deixei de me preocupar com versículos bíblicos para sustentar tal prática e passei a contribuir pelo prazer de ser um cooperador em causas divinas.
Reconheço que nem sempre o dinheiro do dizimo é usado da forma que deveria, segundo meu ponto de vista. Porém, também aprendi a conviver com o jogo democrático das igrejas batistas. Assim, em vez de colocar a bola debaixo do braço quando o jogo não acontece do meu jeito, optei por participar ativamente, apresentando minha compreensão das coisas e ouvindo a compreensão dos outros, na tentativa de fazer prevalecer um uso do dinheiro que represente compromisso sólido com os valores do Reino de Deus.
Por ser um jogo democrático, vez por outra aparece alguém que burla ou tentar burlar as regras. Isso porém não deve invalidar o jogo que, em geral, é benéfico. Corrijam-se as distorções e continue-se a dizimar, digo, a jogar. Afinal, investimentos em coisas ruins não faltam neste planeta. Por que não investir em causas divinas?
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