sexta-feira, 15 de maio de 2009

Bíblia, literalismo e opressão

Publico o texto que segue, disponível na internet e publicado em O Jornal Batista, como ilustração de como pressupostos hermenêuticos mistificados (ainda que com aparência de intelectualidade e racionalidade) podem tornar a palavra de Deus opressora.




As diferenças centrais entre o que penso e o que o autor apresenta, está, primeiro, na hermenêutica usada pelo autor que desconsidera a cultura, e parte do pressuposto teórico (em torno do qual não se há abertura para discussão no segmento em que tal hermenêutica é defendida) que os textos bíblicos foram revelados verbalmente.




O autor dá a entender que o texto de Gênesis não foi influenciado culturalmente em sua produção, portanto deve ser entendido literalmente e, se Paulo se fundamenta nele, tudo o que que for dito não é cultural. Mas o mesmo Paulo "desliteraliza" a narrativa de Gênesis, por exemplo, em Gálatas 4.21-31, em relação a Hagar e Sara, transformando-a numa mera ilustração de dois tipos de aliança! Não seria contraditório?



Deveríamos fechar os olhos para o fato de que a construção do pensamento de Paulo, em suas cartas canonizadas pela Igreja, também se deu também em cima de pressupostos hermenêuticos que são passíveis de questionamento?




Segundo, como consequência, os efeitos sociológicos de tal hermenêutica conduz, por exemplo, a conclusões de que: 1) há pessoas que foram criadas para o céu e outras para o inferno (e, geralmente, os que defendem isso, claro, jamais se assumem como predestinados ao inferno, mas ao céu); 2) que a preocupação dos crentes deve ser com a alma, afinal, distorcendo-se as palavras de Jesus, os pobres sempre terão entre vós (predestinação social). Finalmente, 3) ainda no caso do texto que segue, como terceiro exemplo, reconduz a mulher para a idade da pedra, sob o fundamento místico de que esta seria a vontade "bíblica" de Deus.




Geralmente, e isto não me refiro ao autor do texto que segue, os seguidores de tal hermenêutica não discutem o assunto epistemologicamente, mas politicamente, isto é, logo de início eles definem que que não pensa como eles é liberal e liberal, nos meios evangélicos é um termos de natureza pejorativa que visa queimar politicamente, os assim classificados, perante as comunidades cristãs.




Convido você a ler o texto e a ouvir a magnifica música disponível no final.

Talvez, se tiver paciência, introduzirei posteriormente comentários dentro do próprio texto.
"A ordem estabelecida por Deus na criação
Enviado por WILSON FRANKLIM
06-Jan-2009
“A mulher aprenda em silêncio, com toda a sujeição. Não permito, porém, que a mulher ensine, nem use de
autoridade sobre o marido, mas que esteja em silêncio. Porque primeiro foi formado Adão, depois Eva. E Adão não foi
enganado, mas a mulher, sendo enganada, caiu em transgressão”. – 1Timóteo 2.11-14


 

Não há dúvida de que este texto, atualmente, é uma das passagens mais impopulares do Novo Testamento.

Alguns buscam descredenciá-lo, seja afirmando que seu uso se restringia à época em que Paulo o escreveu; ou ainda, os que
advogam que o mesmo não teria sido escrito por Paulo, mas por outra pessoa no século II.


 

Meu alvo nesse artigo é demonstrar que não há nada de cultural nesse texto, ao contrário, o mesmo faz parte do
perfeito projeto de Deus para humanidade. Aquilo que se chama de “a ordem estabelecida por Deus na
criação”.




Por isso, para compreendê-lo melhor, começaremos por analisar a base usada por Paulo. O capítulo 3 do
livro de Gênesis.


Deus estabeleceu uma ordem na criação (Gn 3)
Em Gênesis 3.1, a serpente, “a mais astuta” de todos os animais, se dirige à mulher e fala...


Analisando o
comportamento da serpente, poder-se-ia perguntar: O que estaria por trás da atitude da serpente em se dirigir, em
primeiro lugar, diretamente à mulher para falar-lhe e não a Adão?

Essa é a primeira pergunta a ser feita na leitura desse
texto.



Vale ressaltar que Deus havia estabelecido uma ordem na criação.
Observe: Em primeiro lugar, o homem (Adão), após ser
criado, foi colocado por Deus como líder e guardião do jardim de Deus, “domine sobre os peixes do mar, e sobre
as aves do céu, e sobre o gado, e sobre toda terra, e sobre todo réptil que se move sobre a terra” (Gn 1.26);
Tomou, pois, o Senhor Deus o homem, e o pôs no jardim do Éden, para o lavrar e guardar” (Gn 2.15). Nessa
perspectiva, Adão não apenas era o líder do Jardim como também era o líder de sua família. Isso fica muito claro quando
Deus afirmou: “far-lhe-ei uma ajudadora que lhe seja idônea” (Gn 2.18b).

Desta forma, Eva complementava
Adão (não é bom que o homem viva só – Gn 2.18a) e Adão complementava Eva.

Contudo, foi a Adão que Deus
instituiu a responsabilidade de liderança do jardim e da família
.

Satanás sabedor de que há uma ordem estabelecida por Deus em toda criação.


E em relação ao ser humano, o homem
deve assumir a responsabilidade de liderar e de ensinar a sua família
. E de que
a mulher deveria apoiar com alegria
aquela liderança
estabelecida por Deus.


Acontece que Satanás quer destruir, a qualquer custo, ponto principal da criação
de Deus. O homem e a mulher, ambos, imagem e semelhança de Deus. Satanás então desfere seu ataque de modo
sutil na ordem estabelecida por Deus. Veja a maneira como ele fez isso.

Satanás vê Adão, mas não lhe dirige a palavra. Ele olha para Eva e de forma sutil a traz para o lugar de liderança
quando lhe dirige a palavra e começa um diálogo com ela.


É exatamente nesse momento que Adão falhou. Aqui, fica claro
que a primeira falha, na queda, foi de Adão que não exerceu o seu papel de líder como deveria ser.1


Se Adão fosse líder
cuidadoso como deveria ser, teria dito: “Eva, pare”! “Esta serpente quer nos enganar. Deus é muito bom e perfeito. Deus sabe, tem e quer o melhor para nós”.


Todavia, infelizmente, Adão abandonou a ordem que
Deus havia estabelecido e o desastre aconteceu.



O ponto principal nesse texto não é que a mulher é mais vulnerável ou mais facilmente iludida do que homem como,
equivocadamente, advogam alguns.


A questão é que nos tornamos facilmente iludidos quando abandonamos a ordem
estabelecida por Deus.




Da mesma maneira, hoje, Satanás quer destruir a igreja, os casamentos e a sociedade fazendo
com que as pessoas quebrem a ordem estabelecida por Deus.

Interpretando 1 Timóteo 2.11-14
Nesse texto existem três palavras que são fundamentais para compreensão do mesmo. A saber: silêncio, ensino e
autoridade.



1- O significado da palavra silêncio.

A mulher aprenda em silêncio, com toda a sujeição (2Tm 2.11).

O que significa
quando Paulo afirma que a mulher deve aprender em silêncio?

Vale notar que o contexto é de aprendizagem e ensino,
“a mulher aprenda em silêncio”.


Mas que silêncio é esse? Será que a mulher não pode ter nenhum tipo
de palavra na igreja?


Eu penso que não, observe.


A palavra silêncio é tradução da palavra grega hesuchia que tem como significado primário calmo, tranqüilo e
sossegado.2


Esse significado é usado em seu contexto imediato em 1Timóteo 2.2: “...para que tenhamos uma
vida quieta e sossegada (hesuchia), em toda a piedade e honestidade”.


Eles oravam para que a vida fosse sossegada, calma e tranqüila.

Na língua portuguesa existe uma conotação diferente entre a palavra sossegado, tranqüilo e silêncio.

Razão pela qual a palavra grega hesuchia traduzida como silêncio no versículo 12 tem seu melhor significado como: prestar atenção de
forma tranqüila, inclusive guardando silêncio (no momento da aprendizagem).3


É um sossego como postura de
aprendizado e submissão.4


Observe que essa realidade é comprovada dentro do próprio texto, em que a palavra
hesuchia (tranqüila, traduzida como silêncio), no versículo 11, é uma expressão de sujeição ou submissão (
a mulher
aprenda em silêncio com toda sujeição
), e também no versículo 12 a palavra hesuchia (sossegada, silêncio)
está em
oposição a autoridade do homem
(“não permito, porém, que a mulher ensine, nem use de autoridade sobre o
homem...”).


Logo, hesuchia significa que as mulheres não deveriam falar na igreja de maneira a questionar a autoridade do homem (o pastor).

 


2. O significado da palavra ensino
“Não permito, porém, que a mulher ensine, nem use de autoridade sobre o marido, mas que esteja em silêncio” (1 Tm 2.12).


Qual a abrangência da palavra ensino aqui dirigida as mulheres?

A resposta estará em outros textos do NT onde a mulher ensina.

Por exemplo, Tito 2.3: “As mulheres idosas, semelhantemente, que
sejam sérias no seu viver... Para que ensinem as mulheres novas a serem prudentes...”.


Logo, existe um tipo de ensino que as mulheres estão realizando.

O segundo texto, 2Timóteo 3.14: “Tu, porém, permanece naquilo que aprendeste, e de que foste inteirado, sabendo de quem o tens aprendido, e que desde a tua meninice sabes as sagradas Escrituras...”

Mas quem ensinou Timóteo foi sua avó Lóide e sua mãe Eunice (2Tm 1.5), uma vez que seu pai não era cristão.

Uma terceira descrição de mulheres ensinando no NT está em Atos 18.26: “Ele começou a falar ousadamente na
sinagoga; e, quando o ouviram Priscila e Áquila, o levaram consigo e lhe declararam mais precisamente o caminho de
Deus”.

Aqui, claramente, Priscila e seu marido estavam ensinando Apolo.


Em suma, o NT apresenta mulheres mais velhas ensinando as mais novas, mulheres ensinando crianças e mulher com
seu marido ensinando outro homem em uma situação informal.


Portanto, quando Paulo diz: “Não permito, porém,
que a mulher ensine, nem use de autoridade... mas que esteja sossegada
(em silêncio)” (1Tm 2.14).


Paulo está afirmando que a mulher não deve ensinar quando seu ensino for parte de um exercício de autoridade sobre a
igreja
.


O próprio versículo 14 demonstra essa realidade quando faz a ligação da palavra ensino com autoridade (ensine, nem use de autoridade).

No meu entender, há uma razão para que Paulo faça essa conexão da palavra ensino com a
palavra autoridade.
A razão pela qual a segunda frase (nem use de autoridade) influencia o significado da primeira (que a mulher ensine) é
que existem outras passagens na Bíblia que diz que a mulher pode ensinar na igreja.




Logo, é errado afirmar que a mulher não pode ensinar nunca em qualquer situação. O que o apóstolo afirma é que a mulher não deve ensinar na Igreja
quando seu ensino for parte de um exercício de autoridade sobre a igreja.



3- O significado da palavra autoridade
Para se compreender o que significa a palavra autoridade em 1Timóteo 2.14 é preciso observar os dois aspectos doofício do pastor (ou do presbítero) que não pertence ao diácono.


Isso pode ser constato analisando 1Timóteo 3
juntamente com 1Timóteo 5.17, que diz: “Os presbíteros (ou pastores) que governam bem sejam estimados por dignos de duplicada honra, principalmente os que trabalham na palavra e na doutrina”.



Vale citar que as duas diferenças principais entre os pastores (e presbíteros) e os diáconos é o ofício de presidir e o de ensinar.

Observe que na lista de qualificações dos pastores (1Tm 3), estes precisam ser aptos para ensinar. Mas, aos diáconos não é exigida essa prerrogativa.

Assim, pastores e presbíteros são chamados a serem supervisores e mestres
no ensino, diáconos não. Portanto, governar e ensinar são as duas prerrogativas que diferenciam pastores (e presbíteros) de diáconos.



Voltando a 2Timóteo 2.12, veja que é exatamente essas duas coisas que são proibidas para as mulheres.

Eu não permito que a mulher ensine e que exerça autoridade sobre o homem.

Diante dessa afirmativa de Paulo, chega-se à seguinte
conclusão para o texto de 1Timóteo 2.11-14: No mínimo Paulo está dizendo que não permite que uma mulher seja pastora ou presbítera.


Se o texto vai além desse significado pode ser aprofundado, mas no mínimo significa isso.

Conclusão
Ficou demonstrado que Deus estabeleceu uma ordem na criação.

Adão abandonou a ordem estabelecida por Deus.
Quando o ser humano abandona a ordem criada por Deus se torna vulnerável ao desastre.
O ponto principal em Gênesis 3 não é que a mulher é mais vulnerável ou mais facilmente iludida.

A questão é que o ser humano se torna facilmente iludido quando abandona a ordem estabelecida por Deus.


Voltando a 1Timóteo 2.14, o argumento usado por Paulo não é cultural, ele transporta seu argumento para antes do
pecado, usando o evento da queda como alicerce para sua justificativa.


Portanto é um argumento teológico, supracultural.
Assim, a verdade transmitida em 1Timóteo 2.14 não é que o homem não possa ser iludido e que a mulher pode seriludida mais facilmente.



O fato é que quando a ordem de Deus é quebrada, homens e mulheres se tornam vulneráveis
às tentações do inimigo. E a vida como planejada por Deus entra em colapso.


Nessa perspectiva, pode-se afirmar que a Igreja também será arruinada se abandonar a ordem estabelecida por Deus para a Igreja.

Diante do exposto, minha posição é que o ofício de pastor (ou presbítero) é uma responsabilidade, dada por Deus,exclusivamente aos homens.

Eu creio que 1Timóteo 2.12-14 dá suporte bíblico-exegético a minha afirmação.


REFERÊNCIAS
1 É importante notar que Adão e Eva estavam juntos. Gênesis 3.6 demonstra isso.
2 BibleWorks 7.0 (Friberg Lexicon ref.13264)
3 GINGRICH, F.W. e DANKER, F.W. Léxico do NT Grego/Português. São Paulo, Vida Nova, 1991. p. 95. Também
pode significar calma.
4 ROBERTSON, A.T. Comentário al Texto Griego del Nuevo Testamento. Barcelona, Clie, 2003. p.571.
WILSON FRANKLIM
Pastor da IB em Vila Jaguaribe, Piabetá (RJ)
wilfran@gmail.com "



Depois desse marabalismo pra manter o poder masculino, silenciando a mulher, ouça como é inteligente e prazerosa a música que segue.




2 comentários:

Anônimo 16 de maio de 2009 às 16:23  

Muito bom o artigo do Pr. Wilson Franklin. Foi assim que os batistas chegaram até aqui como a maior denominação cristã evangélica do mundo e a segunda no Brasil.São as igrejas dessa denominação com teologia biblica ( conservadora) que crescem. Os liberais e frouxos ecumênicos sem doutrina estão perdidos.

Anônimo 16 de maio de 2009 às 16:59  

A hermenêutica do texto de Wilson Franklin é caótica e depressora.
Vemos que no decorrer da história muitos são os que ensinaram uma visão semelhante a respeito da mulher. Aristóteles ensinou: “A mulher é um ser menos perfeito que o homem” (Política Livro I, cap. II, § 12). Osho (místico Indiano moder-no): “A mulher é um homem sem útero” (citando alguém).
Pensando no texto de Gênesis e na visão paulina não há como desvencilhar-se de que há um condicionamento cultural naqueles textos. O texto de Gênesis reflete a visão machista judaica. Um texto que é forjado para colocar palavras na boca de Deus. Aliás, escritores hebreus, condicionados por sua cultura, foram bem versáteis em colocar palavras na boca de Deus; principalmente quando se tratava de oprimir aos outros (pratica também comum nos povos da época) com uma justificativa divina. Estão lá os textos de genocídios na terra de Canaã. Atividade também praticada pelos povos vizinhos de Israel.
O finado Paulo articulou o texto usado pelo Wilson de uma forma espúria. Ele coloca a mulher numa situação de ré e cala em relação a Adão. Na verdade quem definiu a suposta queda não foi Eva, foi Adão. Mas em relação ao homem não há nem uma reprimenda da parte de Paulo no texto. Se Adão, que não devia ter caído, caiu, a mulher tem mais é que assumir o posto de condutora quando for necessário. Quantas e quantas mulheres fazem a diferença positiva quando assumem uma liderança.
O fato é que o machismo judeu se sentia justificado por Deus para tratar a mulher no "cabresto". O que não passa de covardia. Já que não há argumentação racional que justifique tal domínio, resta apelar para a autoridade divina. Paciên-cia!!!!!!
Que as mulheres não se submetam a tal tirania masculina.