sexta-feira, 31 de julho de 2009

A triste trapalhada do Didi (10.1999)

Sob os holofotes de câmeras de televisão e com uma imagem da Senhora Aparecida nas Costas, Renato Aragão - o Didi - saiu à pé, de São Paulo para Aparecida do Norte, num "sacrifício de gratidão".

Sacrifícios como este são feitos diariamente por milhares de pessoas sem a cobertura de uma mídia tão poderosa. São feitos por pessoas comuns que, por não serem mitos, não tem o poder de induzir o comportamento ou inibir o pensamento. Por isso, tal caminhada, não se trata de fato corriqueiro mas de um acontecimento social, pelas repercussões na vida da população brasileira.

A caminhada, conquanto bem intencionada, foi equivocada, senão vejamos: Em relação aos atos filantrópicos, Jesus ensinou: "por isso, quando deres esmola, não te ponhas a trombetear em público, como fazem os hipócritas nas sinagogas e nas ruas, com o propósito de serem glorificados pelos homens. Em verdade vos digo que já receberam a sua recompensa. Tu, porém, quando deres esmola, não saiba a tua mão esquerda o que faz a tua direita, para que a tua esmola fique em segredo; e o teu Pai, que vê no segredo, te recompensará"(Mt. 6.2).
Devemos ter clareza sobre os motivos do nosso envolvimento em causas sociais. Cresce no Brasil o chamado marketing social. Além de ajudar instituições de caridade, algumas empresas estão liberando, parcialmente, seus empregados para que se dediquem a trabalhos sociais. Aparentando avanço social, na verdade não se trata de ato de compaixão. O objetivo é vender mais. Passando uma imagem de bondade e solidariedade, busca-se conquistar a simpatia dos consumidores. Assim, dá-se um pouco com a mão esquerda para ganhar mais com a direita.
Cresce também o número de empresários e executivos que dedicam parte do seu tempo semanal realizando trabalhos sociais. O motivo de muitos, porém, são os benefícios psicológicos que tal ato produz a si mesmos. As razões, portanto, são tão pouco altruístas quanto os atos dos políticos que fazem o bem pensando nos votos. E, aos olhos de Jesus, perdem seu valor espiritual.
Em relação aos sacrifícios pessoais Jesus disse: "ide, pois, e aprendei o que significa: misericórdia quero e não sacrifício"(Mt. 9.13). Jesus concordou com o escriba que afirmou que amar a Deus "...de todo o coração, de toda a inteligência e com toda a força e amar o próximo com a si mesmo, é mais do que todos os holocaustos e todos os sacrifícios"(Mc. 12.33). Somos dispensados de sacrifícios pessoais porque Jesus "já o fez uma vez por todas, oferecendo-se a si mesmo" (Hebreus 7.27). Se Didi está fazendo sacrifícios, é porque desconhece o ensino do Novo Testamento, de forma particular o texto da carta aos Hebreus, em seu capítulo 10, de 1 a 17. O ensino é claro: "não vos esqueçais da beneficência e da comunhão, porque são estes os sacrifícios que agradam a Deus" (Hebreus 13.16).
O terceiro equívoco é a quem está prestando sua gratidão. Quando Pedro curou um aleijado e o povo acorreu para junto dele, ele disse: "por que fixais os olhos em nós, como se por nosso próprio poder ou piedade tivéssemos feito este homem andar?"(Atos. 3.12). Em vez de deixar o povo na ignorância, Pedro ensina-o a se arrepender e a crer em Jesus Cristo(Atos 3). Quando Paulo curou um aleijado, o povo queria prestar-lhe sacrifícios mas ele lhe disse: "amigos, que estais fazendo? Nós também somos seres humanos...mas vos anunciamos as Boas Novas da conversão para o Deus vivo, deixando todas essas coisas vãs!"(Atos 14.8-18). Didi, em seu desconhecimento bíblico, está afastado e afastando o povo do centro da mensagem do evangelho - Jesus Cristo.

Para os que dizem que a caminhada se justifica como um ato simbólico, uma estratégia de Marketing, de uma campanha que visa levantar recursos para carentes, observamos que trata-se de mais um equívoco. Com certeza não foi este o sentimento do Didi mas, se fosse, seria duplamente imoral: imoral, por explorar a ignorância religiosa do povo para levantar recursos financeiros e imoral porque, usando a religião, aqueles que têm contribuído ideologicamente, durante décadas, para manter a estrutura social vigente, convida, este mesmo povo sofredor, para minimizar os efeitos do abismo social existente entre ricos e pobres. Sim, pois todos sabemos que a causa do empobrecimento absurdo de uma considerável parcela da população é efeito colateral do enriquecimento absurdo de uma minoria que, resistindo à mudanças de concepção de vida, continua a acumular, beneficiando-se do injusto sistema vigente.
Caminhando com o Didi, a população continuará no obscurantismo religioso, armadilha daqueles que se beneficiam da ignorância de um povo sofrido, empobrecido, crédulo, sem educação de qualidade, explorado pelo promissor comércio da religião e sem perspectivas futuras.

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