Escolas teológicas e o preparo ministerial (2002)
Foi-se o tempo em que decidir onde preparar-se para o exercício ministerial era tarefa fácil. As opções de graduação eram poucas e, geralmente, a escolha era feita pelo critério geográfico, entre um dos poucos seminários ligados à Convenção Batista Brasileira. Salvo poucas exceções, os candidatos optavam por estudar no seminário mais próximo de suas residências, geralmente por indicação do seu pastor.
Hoje, uma infinidade de escolas teológicas estão competindo, na maioria dos casos com ética, mas cada vez mais agressivamente, tentando seduzir os interessados através das mais variadas estratégias de marketing, passando informações que julgam relevantes para agregar valor à sua marca.
Neste período do ano, as propagandas aumentam, uma vez que muitos estão em processo de decisão quanto à melhor opção para seu preparo ministerial. Decidir aspectos financeiros ou geográficos é fácil. Quantos, porém, estão habilitados a decidir tomando por base a filosofia de ensino adotada, a linha teológica predominante ou a qualidade de ensino da instituição? Quantos sabem o que significa ensino teológico de qualidade? Quantos sabem que qualidade de ensino é influenciada por um conjunto de fatores tais como: formação acadêmica e experiência do quadro docente; estrutura física dos ambientes de estudo; estabilidade política entre os agentes envolvidos; organização administrativa; quantidade e qualidade de livros disponíveis na biblioteca; visão geral e interação que os dirigentes mantém com a sociedade; nível de informação que os alunos trazem consigo para a sala de aula e clareza, da parte dos mestres, do objetivo do conteúdo ministrado e sua correlação com a finalidade do Curso? Poucos se preocupam com isso até porque a maioria dos candidatos é adolescente de nível escolar médio, geralmente imersos numa mistura de crise existencial e um grau significativo de misticismo relacionado à "vontade de Deus". E, nesse caso, a emoção fala mais alto do que a razão pois, mesmo entre adultos, são poucos os que conseguem conciliar razão e "vontade de Deus".
Alguns pastores orientam os candidatos a procurarem um seminário em que se estude mais a Bíblia do que SOBRE a Bíblia. Para se estudar devocionalmente a Bíblia não há necessidade de se matricular num curso superior de teologia. Quem quer se preparar para o ministério precisa conhecer a Bíblia mas, mais do que isso, conhecer muito SOBRE a Bíblia. A ignorância SOBRE a Bíblia, ainda que se domine as línguas originais, se saiba de cor a seqüência de seus livros, nomes de personagens, localização de assuntos e se tenha em memória centenas de seus versículos, tem sido uma das principais causas de baixa qualidade ministerial e, sobretudo, do fundamentalismo sectário (perdoem-me a redundância) presente inclusive em nosso meio. Os defensores de seminários mais devocionais e menos teológicos não percebem que, por essa postura, muitos pastores têm sido facilmente manipulados e arrastados por qualquer brisa doutrinária. Nem mesmo a constatação de que boa parte dos que se aprofundam em teologia se tornam acanhados na manifestação da piedade cristã, justifica tal desvalorização do aprofundamento histórico-teológico da Bíblia.
Fazendo uma avaliação com Dr. David Mein, em 1983, sobre minha passagem pelo seminário, lembro-me de trocarmos idéias sobre o conflito que vivi entre priorizar o estudo no seminário ou o trabalho nas igrejas em que atuei como seminarista. Até hoje não sei se a prioridade adotada foi a melhor. Porém, no exercício pastoral há 19 anos, percebo com clareza a importância de se conhecer melhor, por exemplo, a história do cristianismo, a formação do cânon bíblico ou a hermenêutica bíblica.
Creio que não conseguimos dialogar com certos segmentos da sociedade, nem conviver com diferença de pensamentos em níveis civilizados, porque somos ótimos na citação de textos bíblicos e péssimos no discernimento de seus significados no contexto em que foram escritos. Pela multiplicação de escolas formadoras de técnicos em teologia que não estimulam ou até impedem os alunos de acessarem à diversidade de pensamentos e pensadores, a construção do conhecimento é sufocada pela simples, opressora e escravizante reprodução. Por isso, por despreparo, nos tornamos incapazes de rechaçar o que deve ser rechaçado, de reafirmar o que deve ser reafirmado e prisioneiros daqueles que dominam politicamente as estruturas e o pensamento eclesiásticos.
Não sou professor de seminário, nem exerço função relevante na estrutura denominacional; sou um militante da possibilidade de uma nova vida em Cristo e de valores que creio serem do Reino de Deus, atuando à frente de uma igreja local. Porém, cada vez que alguém manifesta desejo de preparar-se para o ministério, ressalto o privilégio que tive de estudar numa escola teológica cuja maioria de seus professores levavam a sério o princípio batista de liberdade de consciência, possibilitando ou estimulando-nos a conhecer a variedade de pensamentos, garantido-nos o direito inerente de busca da verdade e de construção do próprio conhecimento. Numa escola cujo reitor defendia que "a biblioteca são os pulmões do seminário"
Hoje, uma infinidade de escolas teológicas estão competindo, na maioria dos casos com ética, mas cada vez mais agressivamente, tentando seduzir os interessados através das mais variadas estratégias de marketing, passando informações que julgam relevantes para agregar valor à sua marca.
Neste período do ano, as propagandas aumentam, uma vez que muitos estão em processo de decisão quanto à melhor opção para seu preparo ministerial. Decidir aspectos financeiros ou geográficos é fácil. Quantos, porém, estão habilitados a decidir tomando por base a filosofia de ensino adotada, a linha teológica predominante ou a qualidade de ensino da instituição? Quantos sabem o que significa ensino teológico de qualidade? Quantos sabem que qualidade de ensino é influenciada por um conjunto de fatores tais como: formação acadêmica e experiência do quadro docente; estrutura física dos ambientes de estudo; estabilidade política entre os agentes envolvidos; organização administrativa; quantidade e qualidade de livros disponíveis na biblioteca; visão geral e interação que os dirigentes mantém com a sociedade; nível de informação que os alunos trazem consigo para a sala de aula e clareza, da parte dos mestres, do objetivo do conteúdo ministrado e sua correlação com a finalidade do Curso? Poucos se preocupam com isso até porque a maioria dos candidatos é adolescente de nível escolar médio, geralmente imersos numa mistura de crise existencial e um grau significativo de misticismo relacionado à "vontade de Deus". E, nesse caso, a emoção fala mais alto do que a razão pois, mesmo entre adultos, são poucos os que conseguem conciliar razão e "vontade de Deus".
Alguns pastores orientam os candidatos a procurarem um seminário em que se estude mais a Bíblia do que SOBRE a Bíblia. Para se estudar devocionalmente a Bíblia não há necessidade de se matricular num curso superior de teologia. Quem quer se preparar para o ministério precisa conhecer a Bíblia mas, mais do que isso, conhecer muito SOBRE a Bíblia. A ignorância SOBRE a Bíblia, ainda que se domine as línguas originais, se saiba de cor a seqüência de seus livros, nomes de personagens, localização de assuntos e se tenha em memória centenas de seus versículos, tem sido uma das principais causas de baixa qualidade ministerial e, sobretudo, do fundamentalismo sectário (perdoem-me a redundância) presente inclusive em nosso meio. Os defensores de seminários mais devocionais e menos teológicos não percebem que, por essa postura, muitos pastores têm sido facilmente manipulados e arrastados por qualquer brisa doutrinária. Nem mesmo a constatação de que boa parte dos que se aprofundam em teologia se tornam acanhados na manifestação da piedade cristã, justifica tal desvalorização do aprofundamento histórico-teológico da Bíblia.
Fazendo uma avaliação com Dr. David Mein, em 1983, sobre minha passagem pelo seminário, lembro-me de trocarmos idéias sobre o conflito que vivi entre priorizar o estudo no seminário ou o trabalho nas igrejas em que atuei como seminarista. Até hoje não sei se a prioridade adotada foi a melhor. Porém, no exercício pastoral há 19 anos, percebo com clareza a importância de se conhecer melhor, por exemplo, a história do cristianismo, a formação do cânon bíblico ou a hermenêutica bíblica.
Creio que não conseguimos dialogar com certos segmentos da sociedade, nem conviver com diferença de pensamentos em níveis civilizados, porque somos ótimos na citação de textos bíblicos e péssimos no discernimento de seus significados no contexto em que foram escritos. Pela multiplicação de escolas formadoras de técnicos em teologia que não estimulam ou até impedem os alunos de acessarem à diversidade de pensamentos e pensadores, a construção do conhecimento é sufocada pela simples, opressora e escravizante reprodução. Por isso, por despreparo, nos tornamos incapazes de rechaçar o que deve ser rechaçado, de reafirmar o que deve ser reafirmado e prisioneiros daqueles que dominam politicamente as estruturas e o pensamento eclesiásticos.
Não sou professor de seminário, nem exerço função relevante na estrutura denominacional; sou um militante da possibilidade de uma nova vida em Cristo e de valores que creio serem do Reino de Deus, atuando à frente de uma igreja local. Porém, cada vez que alguém manifesta desejo de preparar-se para o ministério, ressalto o privilégio que tive de estudar numa escola teológica cuja maioria de seus professores levavam a sério o princípio batista de liberdade de consciência, possibilitando ou estimulando-nos a conhecer a variedade de pensamentos, garantido-nos o direito inerente de busca da verdade e de construção do próprio conhecimento. Numa escola cujo reitor defendia que "a biblioteca são os pulmões do seminário"
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