sexta-feira, 31 de julho de 2009

Filhos adolescentes (2001)

Não são poucos os pais que procuram ajuda pastoral por dificuldades enfrentadas com filhos adolescentes. Na maioria dos casos o problema são eles e não os filhos. É que, ou não se lembram que um dia foram adolescentes ou desconhecem o perfil das pessoas nesta fase da vida e como lidar com elas. O que eles descrevem como problema, muitas vezes é evidência de saúde e de que o processo de desenvolvimento dos filhos está ocorrendo como deveria.

Sou pai de dois adolescentes: Mônica, com 17 anos e Raphael, com 15. Até aqui agradeço a Deus a experiência e tiro o máximo proveito da convivência com eles. Através do diálogo e da observação eu mesmo reavalio meus ideais e renovo a mente. Além disso, tenho aproveitado para compreender melhor o que sou hoje, comparando os conflitos que eles vivem com os que vivi.

A forma como as fases anteriores foram vividas, especialmente o tipo de relação mantida com os pais, influencia a adolescência. A clareza dos pais no exercício dos papéis que desenvolvem é referencial importante para os filhos na definição de suas identidades. Mônica tinha oito anos quando decidiu batizar-se. Na época eu estava fora do ministério pastoral, dirigindo um colégio batista. Lembro-me perfeitamente que, no domingo de seu batismo, o Pr. Josias Bezerra telefonou-me para acertar minha participação no batismo dela. Ela atendeu o telefone e ele comentou o que falaria comigo. Prontamente ela respondeu com um bom "nordestinês": "ôxe, pastor! meu pai é meu pai; meu pastor é você"! E ele a batizou!

Penso que a construção da identidade deles é facilitada pela forma como nos relacionamos. Nunca orientei que se comportassem bem por serem filhos de pastor. Protesto quando alguém, diante de uma atitude inadequada para adultos, mas compreensível para criança ou adolescente, os corrige, mesmo em tom de brincadeira, lembrando-os do papel social do pai. Quando diretor da escola em que estudam, orientei coordenadores e professores a tratá-los com os mesmos direitos e deveres de qualquer aluno. Minhas intervenções em todos os momentos de suas vidas têm sido na condição de pai, sem evocar outros papéis sociais.

Essa postura tem um custo. Imagine o filho de um pastor usando brinco, calças rasgadas, com cabelos compridos e fã do Nirvana! Raphael experimentou, separadamente, essas situações. Quando pediu para usar brinco, conversamos muito, analisamos os motivos, a cultura, os prós e contras e permitimos. A fase passou. No início da adolescência, muitas vezes acompanhei-o à loja de produtos de Rock para comprar fitas de vídeo e camisetas. Nas idas e vindas, trocávamos idéias sobre os produtos, visando o desenvolvimento do senso crítico e a rejeição do que poderia ser nocivo. A febre passou e hoje ele lida com o tema de forma tranqüila, estuda guitarra e até está aprendendo a apreciar música clássica. Já está deixando de lado as calças rasgadas. Obviamente, continua usando calças que, em mim que já estou na casa dos "enta" ficariam ridículas, mas nele estão ótimas! Recentemente resolveu cortar os cabelos! E o melhor é que já fez sua decisão ao lado de Cristo e foi batizado por mim.

Algo mexeu fortemente comigo, no semestre passado. Raphael, discordando de um colega que defendia a interpretação literal das narrativas bíblicas da criação, resolveu conhecer meu ponto de vista. Expus meu pensamento com toda honestidade, o qual reforçava suas idéias. Ao final, disse-lhe de forma enfática que a posição que eu adotava não era a única e que ele deveria conhecer, também, os argumentos dos que pensam diferente para formar seu próprio pensamento de forma sólida. Ele não hesitou em responder, com um sorriso meio maroto: "estou entendendo, mas você é o meu pai e o meu referencial"! Para um adolescente, quem argumenta pode influenciar e ser mais importante do que os argumentos. Que responsabilidade!

Ter filhos adolescentes exige habilidade. Eles também convivem com pessoas que cultivam valores e referenciais diferentes dos nossos. Não podem se sentir "Ets", nem serem liberados sem orientação. Com limites exagerados ou sem limites não os ajudaremos. A corda que os liga a nós não pode ser muito curta, nem muito longa. Encontrar a medida certa é um desafio a ser enfrentado através da troca de sentimentos e idéias com pais em situação semelhante; reflexão profunda nas Escrituras; leituras sobre o assunto; oração e, sobretudo, diálogo com eles, manifestando honestidade, coerência e amor. Penso que agindo assim eles serão melhor compreendidos em eventuais erros e nós nos sentiremos menos ansiosos e culpados diante de eventuais barbeiragens que cometermos. E as vias da comunicação sempre estarão desobstruídas para construirmos juntos nossas vidas em Cristo.

OBS.: Este é um registro de experiência e não um modelo educacional para adolescentes. Foi escrito em solidariedade aos pais que, como Gláucia e eu, vivem os dilemas de educar filhos adolescentes.

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