sexta-feira, 31 de julho de 2009

Pastores e psicólogos (2005)

Tenho falado em muitos cultos de formatura mas um deles, no último mês de agosto, teve um caráter especial. É que entre as formandas estavam Eleni Nalon (minha duplamente irmã) e Roberta Wanderley que, ainda como estudantes, nos ajudaram com outras psicólogas, na organização da Clínica de Psicologia do NASCE - Núcleo de Atuação Social Cristã Emanuel - de nossa Igreja.

Essa Clínica, atualmente com dez profissionais da Igreja atendendo diariamente a preços populares, além de ser um espaço de solidariedade, facilita muito o trabalho pastoral. Daí a minha reflexão em torno do tema em epígrafe.

Pastores e psicólogos tem algo em comum: ajudam pessoas, trabalham com a alma humana. A diferença é o ponto de partida, os pressupostos que norteiam cada prática. Psicólogos agem com base em referenciais teóricos, construídos a partir de estudos científicos (entenda-se “estudos científicos” sem o peso ideológico do absolutismo, de proprietários da verdade, acima de questionamentos...) enquanto pastores se baseiam nas Escrituras Sagradas que, construídas a partir da história de um povo e sua relação com Deus, passaram a ser defendidas como o único parâmetro em questões de doutrina e ética da Igreja, desde a Reforma Luterana.

Pastores e psicólogos podem caminhar juntos. Um exemplo é a experiência da psicóloga e teóloga Hanna Wolff narrada no livro Jesus Psicoterapeuta (Edições Paulinas, 1990). Quando teologia e psicologia são usadas a serviço do ser humano, o casamento pode acontecer. É só agir como o casal de porcos-espinho que, numa manhã fria de inverno procuravam aquecer-se mutuamente mas, não é difícil imaginar, enfrentavam alguns “espinhos”. Porém, na medida em que cada um demonstrava disposição para se ajustar um pouco aqui e ali, a aproximação tornou-se possível até que encontraram uma distância exata em que podiam extrair o máximo de calor, ferindo-se o mínimo, mutuamente.

Pastores não devem desprezar conhecimentos construídos cientificamente, nem psicólogos desprezar as Escrituras Sagradas. Nenhum psicólogo deve deixar de ler o livro mais vendido em todas as épocas. Não me refiro, necessariamente, a uma leitura com as lentes da competição, em busca de argumentação ou contra-argumentação para disputas pelo poder sobre indivíduos ou grupos sociais. Refiro-me à leitura na ótica de quem quer conhecer o livro que melhor retrata a alma humana e que, por isso, mais influência tem exercido sobre a cultura em que vivemos.

Pastores e psicólogos trabalham com indivíduos multidimensionais. Assim como os pastores devem reconhecer que as pessoas que os procuram também são portadoras de uma dimensão emocional, psicólogos devem entender que seus clientes também são portadores de uma dimensão espiritual. A experiência espiritual é tão forte e tão generalizada que não podemos desprezá-la ou minimizá-la e, conquanto seja subjetiva, deve ser encarada como objetiva "...na medida em que mediante um consensus gentium é partilhada por um grupo maior”. (Jung, Psicologia e Religião, Editora Vozes, 1999)

Pastores e psicólogos devem aprofundar sua vida espiritual, inclusive porque quanto mais conhecemos a Deus, melhor conhecemos o ser humano (da mesma forma que quanto mais conhecemos o ser humano, melhor conhecemos o seu "deus"). Se para lidarmos com as questões emocionais dos outros, é fundamental equacionarmos bem nossas questões emocionais, não menos importante é que equacionemos bem nossas questões espirituais para lidarmos com a espiritualidade alheia.

Tenho procurado cuidar da minha vida espiritual e emocional. Tenho me submetido a Jesus, como Senhor e Salvador e também já passei por processos psicoterapêuticos. Sinto-me, portanto, à vontade tanto para desafiar psicólogos a darem mais atenção à sua vida espiritual, quanto para desafiar pastores a investirem no cuidado com sua vida emocional. Assim agindo, fazemos um grande bem para nós mesmos, para a sociedade e, particularmente, para os que conosco convivem ou procuram nossa ajuda.

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